Hoje, vamos saudar a mandioca e falar um pouco sobre essa raiz que desempenhou nesse país
“Temos a mandioca e aqui nós estamos e, certamente, nós teremos uma série de outros produtos que foram essenciais para o desenvolvimento de toda a civilização humana ao longo dos séculos”. Apesar de parecer citação de livros de humanidades, retirei esse fragmento do discurso proferido por Dilma Rousseff na abertura dos Jogos Mundiais dos Povos Indígenas, em Brasília, em junho de 2015. Lembro-me que, na época, houve bastante chacota: Como pode uma Presidenta saudar um alimento? Por que insistimos em rir de quem somos e negar a importância da nossa cultura? O narciso brasileiro acha feio o que é espelho.
Hoje, vamos saudar a mandioca e falar um pouco sobre essa raiz que desempenhou e continua desempenhando papel decisivo na formação histórico-cultural desse país que forjou-se Brasil. Na invasão portuguesa, a mandioca foi descrita por Caminha como sendo uma espécie de inhame, pois o inhame já era conhecido nos processos de trocas culturais e invasões no continente africano. Caminha relata: “É como se fosse o pão deles, é uma espécie de pão de pau”. A partir dos contatos posteriores, a mandioca ultrapassou as barreiras da importância originária e virou moeda de troca dos colonizadores em terras ibéricas, africanas e asiáticas.
Por aqui, a raiz continuou sendo a moeda para o mais grato dos sentidos: o paladar. Desempenhando um papel imprescindível, a mandioca desenhou o protótipo da nossa cozinha. É impossível pensar na mesa brasileira sem uma farinheira. Em meio de tantas diferenças culturais, a farinha tornou-se o único elemento que cimenta a identidade nacional, da casa de farinha ao estômago, independente de raça ou classe social. Seja de inox ou plástico, a farinheira é o mais simbólico dos nossos utensílios.
Mandioca, farinha, beiju, farinha d’água, goma, tucupi, beiju de farinha... são alguns dos exemplos de como esse insumo é fruto de uma complexidades de técnicas ancestrais que devem sim ser saudadas. Graças aos conhecimentos daqueles que vieram antes de nós, hoje, podemos garantir a farinha nossa de cada dia e, consequentemente, a manutenção da nossa cultura alimentar. Você sabe o trabalho que dá fazer um quilo de farinha? É de bom grado alimentar a curiosidade para saber. Diante deste breve resumo, fica mais fácil compreender que quando exaltamos a mandioca, exaltamos todo o conhecimento ancestral produzido em seu entorno e, também, a cultura brasileira.
Sim, Dilma, a mandioca é uma das maiores conquistas do Brasil.
*Este é um artigo de opinião. A visão da autora não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.
Edição: Gabriela Amorim