Com a bandeira de luta contra o analfabetismo hasteada, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) realizou, entre os dias 14 e 24 de janeiro, duas turmas do curso de Formação Estadual das Educadoras e Educadores da Bahia. A atividade, desenvolvida em parceria com o Ministério da Educação (MEC), Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e Pronera, foi realizada no Centro de Formação Pátria Livre, em Barra do Choça, no sudoeste do estado, e formou mais de 400 educadores e educadoras de diversas regiões da Bahia.
"A nossa luta é por terra, mas também por educação", destaca Sintia Paula Carvalho, coordenadora do Setor de Educação do MST na Bahia. "Então, é uma prioridade no movimento que todos os sem-terra possam ser alfabetizados, tenham acesso à educação", completa.
A formação foi dividida em duas turmas: a primeira, entre 14 e 18 de janeiro, que reuniu 200 alfabetizadores; e a segunda, entre os dias 20 e 24, que formou outros 210 educadores e educadoras. Ao longo da programação, os participantes puderam se aprofundar na metodologia da Educação de Jovens e Adultos (EJA) do movimento, que é baseada na Pedagogia do Oprimido, de Paulo Freire.
"A nossa concepção de EJA é alimentada em especial pela Pedagogia do Oprimido, onde a gente bebe dessa fonte, de Paulo Freire. A EJA também é formação política, ideológica, cultural, organização na base, e um avanço também na escolarização dos sem-terra. Nós temos nossos objetivos com a alfabetização, que é ensinar a ler, ensinar a escrever, calcular a realidade, construir o novo, que começa nas novas relações e termina com uma sociedade sem exploradores e sem explorados", salienta Sintia.
Nordeste unido pela alfabetização
A iniciativa busca formar educadores e educadoras que irão atuar na Jornada de Alfabetização e Escolarização de Jovens e Adultos das Áreas de Reforma Agrária do Nordeste, que pretende formar mais de 1500 turmas nos nove estados da região. Só na Bahia, a previsão é de que 345 turmas serão formadas nas nove regionais do MST no estado. Sintia destaca que, apesar da luta pela terra envolver muita dor e sofrimento, ela também se constrói com esperança e alegria. É esse espírito que motiva o movimento no processo de alfabetização dos seus assentados e acampados.
"A motivação da alfabetização é uma motivação com muita mística, a mística de ser feliz, a mística do brotar o novo, de alfabetizar o nosso povo. Então, isso fortalece a luta do movimento. Essa Jornada de Alfabetização é para que possamos superar o analfabetismo das nossas áreas, para que o nosso povo saiba que ele tem direito à dignidade, a uma terra, tem o direito a produzir alimentos saudáveis, tem o direito à escola, tem o direito de dar continuidade nos seus estudos, para que possa também ter luta por políticas públicas, por crédito, por alimentação saudável, por moradia, por um posto de saúde, uma saúde com toda a qualidade que todo ser humano necessita e precisa para ser feliz."
Milhares de famílias impactadas
Na formação em Barra do Choça, participaram educadores e educadoras oriundos de quatro regionais do MST na Bahia, que agora retornam para os seus assentamentos e acampamentos para o período de mobilização e organização da jornada. Estima-se que o processo de alfabetização irá impactar mais de 2500 famílias nesses territórios, homens e mulheres que terão suas vidas transformadas pela luta e pela educação.
Uma das educadoras formadas é Jacira Alves, do pré-assentamento Capitão Carlos Lamarca, que fica no município de Muquém do São Francisco, a cerca de 700 km de Salvador. A sem-terra destaca que o trabalho como educadora popular é muito importante, pois valoriza os saberes que os educandos já possuem.
"Meu trabalho como educadora popular é algo extremamente gratificante. Nortear, orientar, compartilhar com os companheiros e companheiras que desconhecem o decodificar, mas trazem consigo conhecimentos e experiências de vivências incríveis. Com essas informações dos educandos, iniciamos o processo de alfabetização do campo, onde o sujeito pode se sentir parte integrante", ressalta.
Para Jacira, a formação de educadores foi muito importante para o desenvolvimento do seu trabalho na Brigada Maria Soares, que compõe a Regional São Francisco do MST.
"Na Formação EJA Nordeste, tivemos palestrantes altamente qualificados, que nos trouxeram uma grande reflexão sobre o papel do educador popular, que nos questionaram como estamos, onde estamos e onde queremos chegar ou conquistar. Para mim, militante do MST, a formação nos traz a certeza que devemos continuar a lutar para transformar. Lutar, persistir, insistir por um território livre do analfabetismo, onde o sujeito possa sonhar, avançar rumo a um Brasil em que o sol possa brilhar para todos."
Lais Brito é outra educadora que volta para casa empolgada com a formação. Moradora do Assentamento Marcha Brasil, no município de Iguaí, médio sudoeste da Bahia, desde os 12 anos, a Sem Terra atuou como educadora no projeto "Sim, Eu Posso" do MST, também voltado à alfabetização. Desde então, a sem-terra passou a se interessar pela Educação Popular do Campo e chegou a cursar pedagogia. Animada com os próximos passos, a militante também faz um balanço muito positivo da iniciativa.
"O curso foi maravilhoso, com professores que foram capazes de nos mostrar com simplicidade o objetivo da formação, que é combater o analfabetismo. Cada detalhe, cada dica, cada descoberta, foi fantástico! Tenho certeza que muito em breve a EJA Nordeste será o projeto mais comentado como o melhor projeto de alfabetização na Bahia", aponta, categórica.
Edição: Nicolau Soares