Bahia

Coluna

VLT vs Porto de Salvador: Resgatar a importância do Planejamento dos Transportes

Para garantir mobilidade, é preciso uma rede integrada multimodal de transporte de passageiros e de carga, de escala macro-metropolitana - Daniele Rodrigues/Sedur
A Logística dos Transportes, para o transporte de passageiros e de cargas, terá um papel estratégico

* Por Juan Pedro Moreno Delgado, professor associado no Departamento de Engenharia de Transporte e Geodesia da UFBA; Pesquisador da Rede de Pesquisa Observatório das Metrópoles - Salvador, INCT.

Será oportuno avaliar em profundidade as características técnicas propostas para o denominado Veículo Ligeiro sobre Trilhos (VLT) de Salvador e se as mesmas são compatíveis com o layout da malha ferroviária existente no interior do estado da Bahia (a rede ferroviária atual) e o grande porto especializado em cargas gerais da cidade.

Construindo uma Rede

O Novo PAC retomará os investimentos em Ferrovias, expandindo a malha ferroviária, visando uma maior racionalização da matriz de transporte nacional, sendo uma ação estratégica do Governo Federal da maior importância. Em paralelo, alavancar o desenvolvimento econômico no estado da Bahia, o qual possui uma das menores rendas per capita do país, indica a construção de estratégias dirigidas a induzir o desenvolvimento regional, mediante a conectividade inter-regional e a atração de investimentos, integrada à elevação da qualidade de vida.

Nesse contexto, a Logística dos Transportes, ou seja, a cuidadosa concepção de uma rede integrada multimodal regional, para o transporte de passageiros e de cargas, terá um papel estratégico. Redes integradas sempre serão o produto de políticas integradas, ou seja, serão um desafio para a governança. Portanto, consideramos fundamental o Planejamento Regional e de Transportes da Região Macro-metropolitana de Salvador. Não termos claro o planejamento como atividade de interesse público elevará os riscos na implantação, administração e futura sustentabilidade econômica e social das diversas infraestruturas de transporte, em curso, na Bahia, sejam urbanas ou regionais.

Portanto, será de extrema urgência, no curto prazo, a concepção de uma rede integrada multimodal de transporte de passageiros e de carga, de escala macro-metropolitana. Esta rede de transporte deverá articular as regiões econômicas Metropolitana de Salvador com as do Recôncavo Sul e Norte, onde se concentram as localidades com os maiores PIBs industriais e de Serviços do estado da Bahia. Qualquer solução tecnológica de engenharia de transportes, no futuro, terá que contemplar as escalas metropolitana e macro-metropolitana, compatibilizando as futuras demandas de carga e passageiros, mediante uma visão integrada.

Resgatar a importância do planejamento significa que não é mais sustentável implantar de forma isolada apenas uma linha ou ligação, senão mais bem, pensar uma Rede ampla que atenda principalmente as necessidades logísticas futuras que estarão sediadas na Baía de Todos os Santos e no porto de Salvador. Não podemos insistir em projetos isolados, qual colcha de retalhos, necessitamos urgentemente construir uma Rede. Nesse contexto estão inseridos projetos tais como, o atual VLT de Salvador, em implantação na cidade o qual deverá observar: a) os estudos de microacessibilidade e integração modal necessários, visando não penalizar o usuário, frente à difícil topografia da região; b) a adequada conexão com o Centro da cidade de Salvador, a qual não está prevista no curto prazo, assim como; c) principalmente, o adequado uso da sua faixa de domínio de origem federal, importante eixo por onde transitaram no passado trens de carga e de passageiros intermunicipais, simultaneamente. Por conseguinte, para o adequado atendimento da demanda logística futura que estará sediada no porto de Salvador, será necessário implementar soluções de transporte multimodais na atual faixa de domínio do antigo trem do subúrbio ferroviário, o qual dava acesso a este Porto, não apenas atender a demanda local com um projeto de transporte público VLT que interdite o acesso do trem de carga.

O porto como solução para o isolamento logístico

Apesar das divergências existentes, o Porto de Salvador está demonstrando ser produtivo e será estratégico para o desenvolvimento econômico do nosso estado, pela sua tendência a se especializar no trânsito de contêiners e cargas gerais. A sua ampliação e requalificação com vistas a absorver o atual crescimento do calado das embarcações no âmbito da navegação internacional é um fato, até por ser o mais bem posicionado no continente e mais apropriado em termos da geomorfologia da baía onde se localiza. Recentemente, foi noticiado que o porto de Salvador receberá navios porta-contêineres da classe 366m no seu terminal. Por conseguinte, o seu acesso ferroviário deve ser preservado, e modernizado com o objetivo de absorver a demanda reprimida por cargas.

Entretanto, isolar este porto implantando trilhos para um VLT de passageiros com bitola de 1,435m, ou seja, com uma seção que não permitiria conexão com a rede existente ou planejada, só perpetuará o isolamento logístico da Bahia. Em outras palavras, a implantação deste VLT urbano impedirá o acesso dos trens de carga ao porto de Salvador, por causa da bitola adotada, o que parece a toda vista, no mínimo, contraditório. Em função do sítio geográfico e da ocupação urbana irregular na área é muito difícil identificar um caminho alternativo para o trem regional de carga.

O planejamento nacional integrado de logística e de transportes está pautado por uma estratégia de desenvolvimento nacional, baseada na integração, em termos de conexões e layout futuro, da malha ferroviária, ou seja, das ferrovias existentes e daquelas planejadas as quais passarão por um processo de transição para ligações com bitola larga (1,60m). Em termos de percentagem, nacionalmente predomina a bitola métrica, podendo esta coexistir de forma transitória com a denominada bitola padrão nacional de 1,6m. Este princípio, por precaução, se aplica para toda a rede ferroviária de transporte futura, ou seja, visando uma estratégia abrangente de desenvolvimento, não é recomendável a compra de material rodante (ou seja, um VLT), sem antes observar aspectos relativos ao dimensionamento e concepção de vias e infraestruturas. Adicionalmente, não é de conhecimento público qualquer estudo técnico que indique a obsolescência do porto de Salvador, como para fechar o seu acesso ferroviário. Ferrovias conectando e abastecendo portos são as soluções mais sustentáveis possíveis, em termos do uso do espaço, do tempo e da energia, para o transporte de cargas… voltaremos aos modos rodoviários em pleno século XXI?

Em síntese

Sintetizando, fechar definitivamente o acesso de trens de carga ao porto de Salvador impedirá criar os sistemas logísticos integrados e estruturantes que possibilitem conectar eficazmente Salvador com outras regiões do Brasil, o qual terá um elevado impacto econômico e social no estado. A futura rede ferroviária integrada, de passageiros e cargas da Bahia, deverá estar eficazmente conectada com a rede nacional existente e/ou planejada, visando enfrentar a estagnação do desenvolvimento oriunda do atual isolamento logístico do nosso estado. Por conseguinte, cabe analisar a compatibilidade da bitola proposta para este equipamento dimensionada em 1,435m na licitação em curso e, os seus impactos na economia regional. Sem dúvida evidencia-se a ação do empreendedorismo urbano - regional no cenário descrito, será necessário construir consensos, porém, sem deixar de ouvir a sociedade organizada.

Atrair investimentos é importante, entretanto, no século 21 só será possível na medida que a Bahia tenha uma clara visão objetivo do Ordenamento Territorial e do Desenvolvimento Social e Econômico desejado. O estatuto da metrópole e o Concidades estadual abrem possibilidades para alicerçar a gestão com a Participação Social de tal forma que possamos produzir Planos com Programas e Metas cujos horizontes temporais ultrapassem os 4 anos de gestão, por conseguinte, o nosso desafio atual é mudar a cultura do não-planejamento existente e recuperar o desempenho das nossas Redes Técnicas, conectando eficazmente o extenso Território Baiano e integrando-o com o planeta.

Edição: Gabriela Amorim