O Ministério Público Federal (MPF) ajuizou ação civil pública contra os deputados federais Ricardo Salles (PL-SP) e Luciano Zucco (PL-RS), ambos da Frente Parlamentar Mista Invasão Zero, requerendo indenizações por danos morais coletivos em favor do povo Pataxó, da Terra Indígena (TI) Barra Velha, localizada no extremo sul da Bahia.
A ação é consequência de ato dos deputados em agosto de 2023, quando os parlamentares, acompanhados de policiamento federal, foram até o território indígena em atitude apontada pelo MPF como “intrusiva, hostil e desrespeitosa”. Os deputados participavam de diligência no âmbito da CPI do MST na região. A ida ao território Pataxó não fazia parte do roteiro oficial da diligência.
“Sem fazer parte do Poder Judiciário, a quem cabe constitucionalmente tratar das questões concretas – e processos judiciais decorrentes – envolvendo controvérsias fundiárias e territoriais, os parlamentares federais agiram como se tivessem alguma função a exercer ali. Afinal, o que lá foram fazer?”, questiona a ação.
O MPF também aponta a relação indissociável entre o “Movimento Invasão Zero” e a “Frente Parlamentar Mista Invasão Zero”, esta liderada pelos deputados federais processados. Para o órgão, além de elevar o risco aos povos da região, esses fatores também resultaram em ataques e tragédias evitáveis como as diversas vidas indígenas perdidas após a ação dos parlamentares na TI Barra Velha.
“O impacto negativo dessas ações vai além do local, minando a legitimidade dos direitos indígenas em nível nacional e alimentando discursos de ódio. A necessidade de reparação para as comunidades afetadas é destacada como essencial para desencorajar futuras violações de direitos e garantir a dignidade dos povos indígenas”, afirma o procurador da República Ramiro Rockenbach, responsável pela ação.
Na ação, o MPF pede à Justiça a condenação dos deputados federais ao pagamento de indenização não inferior a 10% de seus respectivos patrimônios, atualizadas monetariamente e acrescidas de juros. O montante indenizatório deve ser destinado ao povo Pataxó, ocupante da TI Barra Velha, como reparação pelos danos morais e existenciais infligidos.
“As condutas praticadas pelos parlamentares demonstram a naturalização de atos discriminatórios contra essa população vulnerável na sociedade brasileira. Isso constitui terreno fértil para a reprodução simbólica dessas ideias e contribui com a perpetuação destes mesmos atos e ideias desprezíveis em nosso meio social, em incontestável contrariedade ao que dispõe a legislação. Suas ações, longe de serem protegidas pela imunidade parlamentar, representam uma clara violação dos princípios democráticos e dos direitos constitucionais”, ponderou o MPF, em trecho da ação.
Em resposta enviada ao Brasil de Fato Bahia, no dia 22 de abril, o deputado Luciano Zucco afirmou que as diligências conduzidas por ele, com apoio de autoridades policiais, durante a CPI do MST estavam respaldadas pela Constituição e pelo Regimento Interno da Câmara. "Em primeiro lugar, trata-se de uma ação civil pública completamente infundada e estranha. Vamos comprovar nos autos que não houve qualquer tipo de intimidação. Na condição de presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito, conduzi a diligência com toda a responsabilidade e equilíbrio, jamais extrapolando minhas competências", disse.
Relembre o caso
Em agosto, os deputados federais Luciano Zucco e Ricardo Salles respondiam, respectivamente, pela presidência e relatoria da CPI do MST. Na manhã do dia 25, eles aproveitaram uma diligência a áreas do movimento no sul da Bahia para desviar a rota e intimidar indígenas Pataxó. que reocuparam uma área reivindicada como parte da Terra Indígena (TI) Barra Velha, em Porto Seguro (BA).
Na ação, o MPF reitera que a visita dos parlamentares foi feita sem aviso prévio às comunidades ou à Funai. No local, ambos ofenderam os indígenas que os receberam, numa tentativa de intimidação.
“As atitudes e declarações de ambos os deputados são desprovidas de mínimo fundamento, pois eles nada testemunharam. Ouviram alguma versão, a tomaram como ‘verdade’, sem processo, sem contraditório, sem apuração e, mais grave, resolveram se deslocar ao local, acompanhados da Polícia Federal, para intimidar os indígenas e ofendê-los em sua própria existência e dignidade na busca pelos direitos que lhes são constitucionalmente assegurados”, afirma o MPF.
A área que os deputados bolsonaristas foram reivindicar em nome de fazendeiros faz parte do Parque Nacional Pau Brasil. Em fevereiro de 2019, quando era ministro do Meio Ambiente do governo Bolsonaro, Salles concedeu a gestão do parque à empresa Hope Recursos Humanos S/A por um período de 15 anos. Antes, ela era feita pelo Instituto Chico Mendes de Biodiversidade (ICMBio).
*Com informações do MPF.
** Texto atualizado às 09h31 de 23/04/2024.
Edição: Gabriela Amorim