Um relatório com mais de 100 recomendações para reduzir os impactos ambientais e sociais dos parques de energia renovável foi entregue nesta quinta-feira (07) a órgãos do governo estadual, instituições de pesquisa e integrantes dos poderes legislativo e judiciário da Bahia. A ação foi realizada por representantes de comunidades afetadas por empreendimentos, pesquisadores e ambientalistas do estado.
O documento, intitulado Salvaguardas Socioambientais para Energia Renovável, é resultado de uma construção coletiva de medidas de mitigação propostas por mais de 30 entidades, a maioria de povos e de populações tradicionais do Nordeste. “A expansão de renováveis tem intensificado conflitos territoriais, gerado ameaças à biodiversidade, agravado injustiças e danos socioambientais aos povos do campo, da floresta, das águas e aos seus ecossistemas”, afirma o relatório.
Participam da comitiva de entrega do documento Maria Rosa Almeida Alves, agricultora e professora da Serra dos Morgados (BA); Markus Breuss, assessor da Rede Quilombola da Chapada Norte; Renato Cunha e Silvana Canário, respectivamente coordenador-executivo e consultora do Grupo Ambientalista da Bahia (Gambá).
“É preciso entender que os direitos humanos são integrais, não podem ser negociados, violados”, explica a professora Maria Rosa Almeida Alves, do Movimento Salve as Serras, da Bahia, que questiona a instalação de um projeto híbrido, eólico e solar, na Serra dos Morgados.
Ela fala sobre os impactos causados pelo projeto Manacá. “Vem sendo conduzido de forma que desrespeita a legislação ambiental: afirmam que não há nascentes no caminho das torres, sendo que há 36 nascentes catalogadas pela Secretaria de Meio Ambiente junto com a Univasf [Universidade Federal do Vale do São Francisco] exatamente onde terras foram arrendadas pela empresa”, diz. Algumas dessas nascentes abastecem comunidades a até 100 quilômetros do local.
Salvaguardas
Entre as salvaguardas propostas, o grupo sugere um conteúdo mínimo contratual para arrendamento, uma distância mínima de 2 quilômetros da torre eólica para edificações (hoje esse limite não existe) e a priorização de áreas degradadas para instalação de centrais de energia, a fim de evitar mais desmatamento.
E ainda a realização de estudos da poluição sonora, incluindo os infrassons emitidos pelas torres eólicas. Os infrassons, inaudíveis aos seres humanos, são apontados como causadores de distúrbios do sono. Também solicita estudos dos efeitos da sombra dos aerogeradores, conhecido como efeito estroboscópico, igualmente apontado como prejudicial à saúde.
O documento também se debruça em medidas para proteger as atividades tradicionais e a agricultura familiar, cujas políticas de fomento passam a ser ameaçadas em certas regiões do Nordeste pela evasão rural ligada à geração de energia eólica. São sugeridas ainda medidas para garantir a conservação de áreas protegidas e os direitos de povos e comunidades tradicionais, principalmente o direito à consulta prévia, livre e informada prevista na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho.
"A gente frisa que este material é propositivo. Com esta construção trazemos caminhos, possíveis construções de soluções a partir destes impactos. Porque estamos falando de pessoas, de vidas, de biodiversidades e não de lugares inóspitos, inabitados. É também um documento vivo porque pode ser adaptado a diversas realidades e servir para vários atores de diferentes setores", explica Silvana Canário, do Grupo Ambientalista da Bahia (Gambá).
Durante o processo de elaboração do documento, representantes das comunidades participaram de três encontros presenciais, realizados em Salvador (BA) e no Recife (PE), promovidos pelo Plano Nordeste Potência, iniciativa resultante de uma coalizão de ONGs empenhadas em fazer com que transição energética, além de levar em consideração o meio ambiente, ocorra de forma socialmente justa e inclusiva.
Edição: Gabriela Amorim