A saúde pública no Brasil vive um sensível momento para o combate da dengue. Na última quinta-feira (29), o país registrou a marca de mais de 1 milhão de casos confirmados da doença só neste ano, de acordo com o Painel de Monitoramento das Arboviroses do Ministério da Saúde (MS). Em todo o país, 214 pessoas já morreram da doença e mais 687 óbitos estão sob investigação.
Dados da Secretaria de Saúde da Bahia (Sesab), apontam que, em todo o estado, dezembro até fevereiro, foram contabilizados 23.458 casos prováveis da doença. A Bahia é o primeiro estado do Nordeste em número de casos de dengue e alcança a 15 posição do país.
O maior quantitativo de registro está concentrado no sudoeste do estado, sendo os municípios de Piripá e Jacaraci os líderes. Além de estar no topo da lista de casos prováveis, as duas cidades já registraram mortes sendo uma em Piripá e duas em Jacaraci. As outras mortes ocorreram em Feira de Santana (1), Vitória da Conquista (1), Barra do Choça (1), Ibiassucê (1) e Irecê (1), totalizando oito mortes até o momento na Bahia.
A dengue é uma arbovirose (doença transmitida por inseto) endêmica no Brasil, o que significa dizer que existe, em períodos normais, a presença do vírus e da doença estabelecida no país de forma moderada. De acordo com a médica generalista, especializada em saúde da família, Dheise Zimmerman, apesar do crescimento de 179% no número de casos em relação ao igual período do ano anterior, em períodos de calor e chuva é normalmente esperado um aumento para o número de casos da doença.
“O vírus da dengue não desapareceu e agora está voltando, ele sempre esteve ali, é endêmico. Agora é epidêmico porque veio aí um ‘boom’ das chuvas, com toda uma questão climática do tempo, um período em que vai ter mais chuvas acumulando água em qualquer parte, a temperatura aumenta, o calor, tudo isso são fatores favoráveis. Então, nesse período do ano, existe uma tendência maior de virar epidemia”, explica.
Segundo a Sesab, até o momento, 64 municípios baianos declararam situação de Surto/Epidemia para dengue e 338 municípios notificaram agravo no número de casos possíveis da doença.
Como identificar a dengue?
Em tempos de viroses diversas, os sintomas da dengue podem ser confundidos com outras doenças. De modo geral, a contaminação por dengue causa principalmente febre, podendo ter duração de sete a 10 dias. Dor muscular é um dos sintomas que pode causar confusão entre pacientes, uma vez em que pode ser confundido com sinais de zika. “Não são 100% das pessoas [infectadas] que vão ter dores musculares, mas é um sintoma bem prevalente na dengue. Já ao contrário da zika que enfatiza mais as dores nas articulações”, esclarece Dheise.
Além da febre, das dores musculares e fortes dores de cabeça, que também são comuns à outras doenças virais, a dengue pode ser caracterizada por dor atrás dos olhos, acompanhada de náuseas ou vômitos, diarreia, manchas vermelhas na região do tórax, braços, nas palmas das mãos e dos pés, com coceira ou não, e/ou dores abdominais intensas.
A médica alerta ainda sobre possíveis sangramentos que podem indicar dengue. “Pode ser um sangramento na gengiva enquanto escova os dentes, por exemplo, vômitos com sangue. A mulher que não estava esperando a menstruação e de repente veio um pouco antes e já está com sintomas de dengue, é preciso ficar atento”, explica.
Dheise lembra que não necessariamente todos os sintomas serão apresentados juntos, mas no caso de identificação de algum deles, é importante se direcionar imediatamente para uma unidade de saúde, onde será realizado um exame laboratorial para o diagnóstico da doença.
É importante que não seja feita a automedicação em casos de suspeita de dengue, tendo em vista que há medicações como AAS e anti-inflamatórios não esteroides, como ibuprofeno, cetoprofeno, diclofenaco, que podem agravar o quadro da doença. “[Para quem] faz uso de anticoagulantes, se estiver com suspeita de dengue, tem que procurar o médico para avaliar o risco de continuar tomando as medicações e para ter um acompanhamento adequado”, aconselha.
Como se prevenir?
Dheise afirma que a saída mais efetiva para conter a doença é combater o mosquito Aedes Aegypti, vetor de transmissão, que pode causar além da dengue, zika e chikungunya. É importante eliminar todos os possíveis acumuladores de água parada, como pneus, vasilhas, tampas, sacolas plásticas, vasos de plantas, depósitos de água, garrafas, etc., qualquer recipiente em que o mosquito possa vir a depositar os ovos. Segundo o MS, 75% dos focos do mosquito estão dentro de residências.
Além do combate ativo ao mosquito transmissor, o uso de repelentes no corpo é uma forma de manter o Aedes Aegypti afastado. Os repelentes indicados são os que contém os princípios ativos picaridina, DEET e IR3535, aponta a médica. Dheise lembra ainda que gestantes têm direito a receber repelentes de forma gratuita através do SUS pelo menos uma vez ao mês. Uma outra aposta são as “barreiras físicas”, como calças e camisas de manga, que podem impedir o ataque do mosquito.
De modo geral, Dheise destaca a importância de se manter sempre uma alimentação balanceada para fortalecer o sistema imune, além de hidratação constante.
“A hidratação é a base do tratamento da dengue. Na verdade, não existe uma medicação específica [para tratar a doença], a gente vai fazer uma reidratação sempre. Agora a gente está no verão, a tendência é que as pessoas não se hidratem adequadamente. E aí foi contaminado com o vírus da dengue, para evoluir para uma dengue hemorrágica pode acontecer no período de 12 a 48 horas, podendo evoluir para óbito. Então a pessoa tem que estar bem atenta e se alimentar o melhor possível”, diz.
Vacinação: um reforço ao combate
Aliado ao combate do mosquito, desde o início de fevereiro a vacinação de crianças de 10 e 11 anos teve início na Bahia. A princípio, em apenas as regiões de Salvador, Feira de Santana, Camaçari, Itabuna, Ilhéus, Jequié e Barreiras têm doses de vacina disponíveis nas Unidades Básicas de Saúde (UBS) do SUS.
Com a vacina, é possível que a carga viral transmitida seja reduzida, diminuindo consequentemente a letalidade da doença. Isto porque, ao picar uma primeira pessoa, o mosquito carrega o vírus e distribui para outras pessoas, que picadas também vão desenvolver a doença. “O mosquito me picou e vai passar para outra pessoa esse vírus que foi reproduzido e gerado no meu corpo, [mas] ele já vai ser mais fraco, não vai ter a mesma potência que teria se eu não tivesse sido vacinado”, explica a médica.
Dheise Zimmerman ressalta que, para alcançar a redução da letalidade da doença, é necessário um trabalho coletivo: quanto mais pessoas estejam vacinadas, menor será a carga viral transmitida. “Sozinha a minha vacina não vai adiantar nada, a gente só vai conseguir [combater a dengue] a partir do momento que haja uma imunização coletiva”, acrescenta.
Edição: Gabriela Amorim