IBGE aponta que o Brasil tem 18,6 milhões de PCDs; destes, 10,3% estão no nordeste
A luta por direitos das pessoas com deficiência (PCDs) tem uma longa história no Brasil de muitas conquistas, mas também com um longo caminho a ser percorrido. Pelo menos desde 1980, as PCDs se organizam no país para garantia e luta por direitos.
E é sobre essa trajetória de luta que trata a quinta reportagem da série No Rastro das Lutas, Movimentos populares abrindo caminhos para a democracia e direitos no Brasil, produção em parceria entre o Brasil de Fato e a Coordenadoria Ecumênica de Serviço (CESE).
“O movimento pelos direitos das pessoas com deficiência no Brasil se iniciou em 1980, com um primeiro grande encontro organizado em Brasília para juntar todas as áreas de deficiência e discutir a posição do movimento”, conta a ativista Rosângela Bieler. Ela explica que, naquela época existia uma divisão grande entre as organizações “de pessoas com deficiência” e “para pessoas com deficiência”, claramente separando as instituições que falavam por esse segmento e as organizações lideradas pelas pessoas com deficiência.
Para Rosângela Berman Bieler, uma das fundadoras do Movimento pelos Direitos das Pessoas com Deficiência e do Movimento de Vida Independente, no passado o segmento foi mais invisível e enfrentou dificuldade de ter representação de pessoas com deficiência dentro do próprio movimento de mulheres e do movimento negro, por exemplo.
“Em cada estado se criaram os congressos nacionais na área da deficiência. Vários marcos foram acontecendo durante todos esses anos e são fundamentais. Os objetivos [de luta] eram realmente trazer a causa da deficiência para essas instituições”, conta.
Rita Guaraná, mulher nordestina, com baixa visão e membro da coordenação colegiada do Movimento Brasileiro de Mulheres Cegas e de Baixa Visão, também destaca momentos relevantes para o histórico de luta de mulheres com deficiência. “Um dos marcos que eu considero são as Conferências das Pessoas com Deficiência que acontecem de quatro em quatro anos. É de lá que se elegem as leis e aonde realmente somos protagonistas dos nossos direitos”, aponta.
Um avanço apontado por ela nessa luta é a criação dos Conselhos de Direitos da Pessoa com Deficiência. “Nesses conselhos, há realmente uma grande inovação e protagonismo. Eles ainda não são o que deveriam ser, fortes e combativos, mas precisamos fortalecer o Conselho de Direito, tanto em nível estadual, municipal, como nacional”, ressalta Rita.
Barreiras
Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), com base na Pesquisa Nacional de Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua) de 2022, apontam que o Brasil tem 18,6 milhões de pessoas com deficiência. Este número representa 8,9% de toda população brasileira, com idade igual ou superior a dois anos. Esse mesmo estudo, aponta o Nordeste como a região com o maior percentual de pessoas com deficiência, com 10,3%, o equivalente a 5,8 milhões de pessoas com deficiência.
Apesar de números tão expressivos, Rita Guaraná, mulher pernambucana e periférica, afirma que as primeiras barreiras para essa população ainda são os preconceitos, tanto das pessoas como institucionais. “ Ainda tem os preconceitos do capacitismo, que é o preconceito com a pessoa com deficiência, de achar que nós, pessoas com deficiência, não somos capazes de realizar e produzir, de fazer parte de um projeto, de trabalhar”, acrescenta.
Essas barreiras também chegam ao mercado de trabalho. De acordo com a pesquisa Pessoas com Deficiência e as Desigualdades Sociais, realizada pelo IBGE, em 2022, a taxa de ocupação de pessoas com deficiência no mercado de trabalho ainda é bem baixa, 28,3%. Um porcentual bem menor do que o de pessoas sem deficiência que é de 66,3%. Rita Guaraná reforça que, mesmo com a obrigatoriedade legal de contratação.
“As empresas ainda hoje resistem, preferem pagar as multas, para a não implantação dessa lei nas suas empresas, porque há muita divergência. E as empresas que aceitam as pessoas com deficiência têm a cultura terrível e capacitista de querer uma deficiência leve. Não existe uma deficiência leve, existe uma pessoa com deficiência”, pontua Rita.
Para ultrapassar todas essas barreiras, tanto Rita quanto Rosângela, ressaltam a importância da organização coletiva. “Para juntar forças e conseguir ter essa voz forte ativa para, não só individualmente, nos beneficiarmos da legislação e das políticas públicas que vão surgindo, mas para termos voz, para construirmos mais e continuar. Monitorando para que essas leis, essas políticas públicas sejam implementadas efetivamente, sem corrupção e renovadas quando necessárias”, afirma Rosângela.
A série de reportagens e podcasts ''No Rastro das Lutas: Movimentos populares abrindo caminhos para a democracia e direitos no Brasil'' é mais uma iniciativa que se relaciona com as ações dos 50 anos da CESE, trazendo uma abordagem voltada para sensibilização da sociedade acerca da contribuição social, cultural, econômica e política dos movimentos sociais no país. E conta com apoio do programa Doar para Transformar.
Edição: Gabriela Amorim