Você já ouviu falar em glaucoma? Uma das principais causas de cegueira irreversível no mundo pode ser evitada com conhecimento e informação. A estimativa é que só no ano de 2022, 80 milhões de pessoas no mundo tenham glaucoma. Na Bahia, a população negra e acima de 40 anos deve ter atenção redobrada.
Para falar deste assunto tão importante, o Brasil de Fato Bahia convidou o médico Bernardo Leitão Guerra. Ele foi residente no Hospital Universitário Edgard Santos, da Universidade Federal da Bahia (UFBA), é especialista em oftalmologia pelo Conselho Brasileiro de Oftalmologia, com especialização em glaucoma no Hospital Santa Luzia onde atua como preceptor do serviço de glaucoma.
Brasil de Fato - Glaucoma é uma doença que acomete muita gente na Bahia e no mundo, mas tem pessoas que ainda desconhecem essa doença. Em poucas palavras, o que é o glaucoma e como afeta a saúde ocular?
Bernardo Leitão Guerra - Glaucoma é uma das principais causas de cegueira e é a principal causa de cegueira irreversível no mundo. A gente acredita que boa parte da cegueira provocada por essa doença seja por conta do desconhecimento a respeito da doença por toda a população. No mundo, estima-se que 80 milhões de pessoas, em 2022, tenham glaucoma. E, no Brasil, na população acima de 40 anos, a prevalência, geralmente, é 3,5%. Glaucoma nada mais é do que uma neuropatia ótica progressiva, com alterações típicas da estrutura e função dos nervos ópticos que pode, lenta e progressivamente, ocasionar a perda da visão do paciente.
Quais são os primeiros sintomas do glaucoma? Uma pessoa pode ter a doença e ser assintomática?
Por se tratar de uma doença que tem vários tipos, vai depender do tipo de glaucoma que você vai ter para ter sintomas ou não. Por exemplo, na infância, quando a gente tem o glaucoma congênito, a gente pode ter lacrimejamento excessivo, o choro excessivo do bebê. A gente pode ter um olho mais aumentado do que o outro, que a gente chama de buftalmo. A gente pode ter a própria opacidade da córnea, prejudicando a visualização do olho.
Num paciente com glaucoma primário de ângulo aberto, que é o tipo de glaucoma mais comum. Normalmente, após os 40 anos, a gente tem um paciente assintomático, que não percebe. Esse é o grande risco da doença. Esse é o glaucoma mais prevalente de todos, e o paciente não percebe que vai perdendo a visão e essa visão vai sendo acometida e vai piorando aos pouquinhos. O campo visual vai se perdendo. Só que, como o paciente fica com os dois olhos abertos, ele não consegue perceber essa alteração de campo visual que ocorre.
A gente tem também o glaucoma de ângulo fechado, em que, eventualmente, se esse fechamento angular ocorrer de forma aguda, o paciente pode ter sintomas bem intensos, bem importantes. O paciente pode ter uma dor intensa, olho vermelho, baixa visão. O paciente sente uma urgência oftalmológica mesmo e vai procurar por uma emergência por conta de tamanha dor que ele sente. Mas essa é uma minoria dos casos. Então, é importante ter um contato frequente com o médico oftalmologista para determinar qual tipo de glaucoma que o paciente tem e determinar o melhor tratamento a ser executado em cada estágio da doença que foi encontrada.
Existe uma idade, raça ou região do país em que a prevalência é maior? O que explica essa maior incidência em algumas populações?
O principal fator de risco para o glaucoma é o aumento da pressão intraocular. Por isso, é fundamental o paciente está sempre no seu médico oftalmologista para avaliar e verificar se sua pressão já está provocando algum tipo de glaucoma e requer tratamento ou se ela é um fator de risco importante que necessita ou não de tratamento. Se a gente for falar sobre idade, o paciente com a idade maior do que 40 anos já começa a ter um fator de risco mais aumentado para o glaucoma e, quanto maior a idade do paciente, maior o risco dele desenvolver a doença. Ou seja, um paciente com 80 anos tem mais chance de ter glaucoma do que um paciente com 40 anos.
Com relação a raça, vai depender do tipo de glaucoma que a gente tiver lidando. Se a gente for falar sobre glaucoma primário de ângulo aberto, que é o mais comum no Brasil, ele está mais associado à raça negra, mas se a gente for, por exemplo, conversar sobre glaucoma primário de ângulo fechado, ele é mais comum em asiáticos, esquimós do que na população geral.
Com relação às regiões do nosso país, a gente tem aqui no nordeste, especialmente na Bahia, uma maior prevalência da raça negra, e isso impacta diretamente no maior número de glaucoma primário de ângulo aberto na nossa população, mas na região, por exemplo, de São Paulo, a gente tem bastante casos de glaucoma de ângulo fechado, provavelmente por toda a influência asiática, especialmente japonesa, nessa região. E se a gente for para a região sul do país, a gente tem um tipo de glaucoma que é mais comum lá do que na Bahia, que é o glaucoma pseudo-esfoliativo, que é o mais comum em pacientes de origem europeia.
Glaucoma é uma doença possível de ser evitada ou prevenida? Qual a influência do fator genético nisso?
O glaucoma primário de ângulo aberto não pode ser evitado. Não se pode evitar de um paciente ter a doença, mas a cegueira por essa doença ela pode ser evitada, pode ser prevenida. Inclusive, é uma das principais causas de cegueira evitável, dependendo do estágio da doença em que você encontre. Por isso que é muito importante fazer uma avaliação completa com seu médico oftalmologista para determinar. Caso esteja acontecendo a doença, você fazer o tratamento de controle para que não haja progressão do seu glaucoma.
Um paciente que tem um parente, especialmente de primeiro grau, pai, mãe, irmãos, que tenham a doença, tem mais chance, muito mais chance, inclusive, de ter glaucoma do que a população geral, mas não necessariamente isso implica que ele terá glaucoma. Ele só tem mais chance de ter.
Como é feito o diagnóstico de glaucoma? Uma vez confirmada a suspeita, quais são as etapas do tratamento? Tem cura? Quais medicações são mais eficazes?
O diagnóstico de glaucoma é feito em consultório. É necessário fazer uma boa anamnese do paciente, juntar com informações de exames complementares que avaliam a estrutura, a função do nervo óptico, o ângulo do olho, o processo de drenagem do húmor aquoso, importante para gente determinar o valor da pressão intraocular. Reunindo todos esses dados, uma vez feita a suspeita e acreditando que o paciente tenha glaucoma, a gente tem alguns tratamentos que podem ser realizados, dependendo do tipo de glaucoma ou do estágio em que esse glaucoma se encontra. Se o paciente, por exemplo, tiver um glaucoma primário de ângulo aberto, que é o mais comum, leve a moderado, ele pode iniciar o tratamento dele com laser ou com colírio. Caso a gente controle dessa forma, a gente vai acompanhando o paciente periodicamente. Caso a gente não controle, a gente pode fazer alguns tipos de cirurgias e vai depender de cada caso para determinar a melhor conduta para cada paciente individualmente.
Caso ele tenha uma doença mais avançada e a gente não tenha controle, a gente pode partir direto para a cirurgia, porque talvez os colírios não sejam suficientes para esse paciente.
Quando a gente fala do glaucoma de ângulo fechado, a gente tem alguns outros tratamentos a laser como eridotomia, eridoplastia que podem ajudar. Eventualmente, até a cirurgia da catarata pode contribuir nesse perfil de paciente, mas vai depender muito da avaliação que é feita em consultório com cada paciente de maneira individualizada para determinar o melhor tratamento para o paciente.
Na Bahia, o diagnóstico, tratamento e acompanhamento é feito pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Onde a população pode procurar por ajuda?
O tratamento do glaucoma pode ser realizado, sim, pelo SUS que é universal. Normalmente, o paciente busca via posto de saúde, o encaminhamento para um serviço de referência para distribuição de colírios e de segmento da doença mesmo. E, caso haja alguma urgência, o paciente apresente dor no olho, olho vermelho, tem também os serviços de urgência, como a UPA do Cabula e o Hospital Geral do Estado, que podem fazer um primeiro atendimento de maneira emergencial nesse paciente.
Edição: Gabriela Amorim