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Jovem baiana é aprovada em medicina em 42 universidades

Ilary Reis estudou em escolas públicas de Maragogipe (BA) e vai cursar medicina na UFBA

Salvador |
Ilary Reis foi aprovada em 42 universidades do país para o curso de medicina e escolheu cursar na UFBA - Arquivo pessoal

O que você quer ser quando crescer? Essa talvez seja a pergunta mais frequente sobre o futuro, quando se é criança. Ser médica ou médico é o sonho de muita gente e é também o sonho realizado de Ilary Reis, jovem negra, de 23 anos que acaba de ser aprovada em medicina em – nada mais, nada menos – 42 universidades brasileiras.

Ilary, nasceu em Salvador, mas é filha cativa do Recôncavo. Com dois dias de vida se mudou para a região e foi na cidade de Maragogipe que cresceu e se criou ao lado dos irmãos, primos e avós. Cercada do apoio da família materna, já que não tem aproximação com o pai e nem com parentes por parte do pai, Ilary faz parte de uma família numerosa e cresceu cercada de muitos incentivos aos estudos.

“Tenho dois irmãos e vários primos que são considerados irmãos. Todo mundo morava na mesma casa. Meus avós criaram os próprios filhos e quase todos os netos deles”, declara Ilary, orgulhosa dos seus mais velhos. Encantada pela literatura e pelas histórias, ela se diz uma apaixonada pelas palavras. O gosto pela leitura, combinado a disciplina e a determinação foram ingredientes poderosos para o sucesso no Enem.

“Eu gostava da estrutura do livro, do formato, do layout, da maneira com os autores entregavam a sua identidade nas obras. Então, eu amava e amo livro”, declara a futura doutora. Estudante do Colégio Estadual Gerhard Meyer Suerdieck onde concluiu o ensino médio, Ilary sempre foi visionária. Não por acaso, sociologia e filosofia são as suas disciplinas preferidas e, segundo ela, foram instrumentos valiosos no seu entendimento de vida e de mundo.

Das 42 opções, Ilary escolhe a Universidade Federal da Bahia (UFBA) por considerar a melhor do Brasil. Mesmo sendo aluna com alto rendimento nas provas e avaliações, o resultado foi além das expectativas. “Eu não esperava passar em tantas faculdades, eu só queria uma, mas eu fiquei muito feliz. Eu não esperava mesmo. Eu acho que a ficha ainda não caiu, só vai cair quando iniciarem as aulas”, declara a mais nova estudante de medicina da UFBA.

Essa experiência deixa Ilary tão feliz quanto reflexiva. “Eu aprendi que você não precisa ser 100% para conquistar o que você quer. Nos 90 você já passa. Entendi que você não precisa ser perfeito. Você pode alcançar seus objetivos antes da perfeição”, afirma Ilary consciente de que o caminho não é fácil, mas que esse mesmo caminho precisa ser percorrido para alcançar os sonhos.

Sobre a decisão de cursar a Federal da Bahia, ela se assume bairrista e enche a boca com gosto para dizer o quanto ama ser baiana. “Eu gosto do meu estado, então não poderia ir para outro lugar. Eu trabalho aqui, eu moro aqui, a minha família inteira é daqui. Minha família é essencial. Além disso, a UFBA é uma referência de universidade. É muito bem conceituada”, comemora a universitária que conta os dias para a primeira aula.

Mulheres Pretas

A conquista dessa jovem garota do Recôncavo inspira e amplia o horizonte de quem como ela enfrenta uma vida modesta, no interior da Bahia. Uma vida simples de recursos, mas abastecida de tudo o que é necessário para seguir em frente: apoio e amor. É por isso que essa vitória de Ilary é também vitória coletiva de toda uma sociedade preta e pobre que enfrenta muitos obstáculos para se manter nos estudos. Ilary reconhece o quanto a família, em especial, as mulheres, foram força e inspiração.

“Eu percebi desde cedo as dificuldades que a mulher tem que enfrentar para conquistar os seus espaços. Eu vinha batalhando, buscando. A minha avó também, a minha mãe. Então, essas mulheres foram as maiores inspirações da minha vida”, declara a estudante com alegria. “A minha família inteira sempre me deu muito apoio. Eles não me pressionavam. Eles não me cobravam. Eu tinha um ambiente tranquilo para estudar e toda uma estrutura familiar. Não financeira, mas emocional, que contribuiu para a minha aprovação”, afirma a jovem ao compartilhar essa vitória com quem a ajudou no dia a dia.


Ilary faz questão de destacar a importância do apoio e incentivo familiar / Arquivo pessoal

Ilary escolhe medicina motivada por ajudar ao outro. “A medicina é um ramo que você quer e que você consegue ajudar”, afirma a estudante que pensa em fazer a diferença não só no curso, mas também na vida das pessoas depois de formada. Aos jovens que também sonham com um curso muito disputado ou que acham que a universidade é uma possibilidade muito distante, Ilary pede que não desistam e deixa algumas dicas para começar.

“Leiam. Primeiramente, leiam. Leiam tudo o que vocês puderem. Desenvolvam o gosto pela leitura. Depois, sejam autônomos. Assumam a responsabilidade pelos seus estudos. A vaga no curso que você quer ou no concurso que você quer não vai ser dada. Então, busque sempre conteúdo a mais do que você vê na escola. Exercícios a mais. Oriente o seu professor de sugestões. Participe. Entendo que esse processo de estudos é muito pessoal, você precisa ter atitude para querer aprender muito”, declara Ilary ao detalhar as dicas de milhões.

Soldado Militar

Apesar da pouca idade, Ilary além de estudante é também trabalhadora. Há três anos, ela passou no concurso da Polícia Militar, onde atua como soldado. “Eu passei nova no concurso. Estava saindo da escola. Eu acho que isso se deve ao fato de nunca ter visto o estudo como um martírio, como uma penitência. Eu via como uma etapa com uma oportunidade. Eu me divertia com as coisas que eu aprendia”, declara Ilary.

Sobre as mudanças na rotina e sobre a vida de soldado e estudante, ela planeja e não desanima. “Eu não trabalho todos os dias Eu tenho uma rotina flexível. Eu trabalho 12 horas durante o dia e 12 horas à noite, em dias intercalados. É uma escala adaptável”, explica a estudante. Ilary planeja estudar em todos os horários vagos.

“Todo mundo diz que vai ser super puxado. Que a minha vida vai ser uma loucura, mas eu estou doida para começar logo essa loucura. Eu gosto de desafios. Estou doida para estudar mais, para trabalhar mais. Para viver essa rotina que eu busquei e conquistei”, declara com otimismo e expectativas.

Edição: Gabriela Amorim