Após insistência dos religiosos e religiosas que frequentam o Ilê Asè Airá Tolami, a Coordenação de Repressão dos Crimes de Intolerância e Discriminação (Coercid) alterou o registro inicial do arrombamento ao terreiro passando a considerar a ocorrência como crime de racismo religioso. A princípio, a invasão e depredação do espaço religioso, ocorrida no último dia 11, tinha sido registrado apenas como furto e destruição de objeto de valor artístico ou cultural.
A coordenadora da Coercid, Ana Cristina de Carvalho, explicou que realizou uma nova oitiva ontem (14), com a advogada Camila Garcez, que está representando o Ilê Asè Airá Tolami no caso. “As declarações de Camila foram bem circunstanciadas, consistentes. Após ouvi-la ficou claro que houve sim crime de furto e dano ao patrimônio, mas também houve racismo religioso”, afirma.
Depois disso, a coordenadora explica que a ocorrência inicial será alterada e passará a ser investigada como crime de racismo religioso, e não apenas furto e dano. Para Ana Cristina, esse não é um caso isolado e registros equivocados, como este, acabam acontecendo em outros casos. “Realmente há dúvidas sobre a legislação, e a gente [Coercid] procura saná-las”, diz.
A Coercid foi criada em março de 2022 para acompanhar ocorrências registradas no estado da Bahia sobre racismo, intolerância religiosa, LGBTfobia e discriminação a pessoas com deficiência (PCDs). Ela é responsável por dar suporte às investigações realizadas pelas delegacias nesses casos até que sejam remetidos à Justiça. Além disso, a coordenação também realiza capacitações para a polícia civil, para sanar dúvidas sobre legislação e tipificação dos casos.
Racismo religioso
Ana Cristina explica que há duas práticas clássicas do crime de racismo religioso recorrentes na Bahia e no Brasil. “Uma delas é justamente o que aconteceu no Ilê Asè Airá Tolami, com invasão do local, furto de objetos, dano ao patrimônio, desrespeito aos objetos de culto”, explica. A outra forma é a agressão aos praticantes, normalmente, pessoas que estão em local público utilizando vestes e/ou objetos que as identifique com religiões de matriz africana. “Essas pessoas podem ser agredidas física ou verbalmente por conta do traje que usam”, acrescenta.
Em ambos os casos, a coordenadora destaca que há uma conduta que visa impedir as práticas dos cultos de religiões de matriz africana. As pessoas vítimas ou testemunhas desses crimes podem registrar denúncia na delegacia mais próxima ou mesmo no próprio Coercid. Neste caso, a coordenação, posteriormente, encaminha a ocorrência para ser conduzida pela delegacia responsável pela área onde o crime aconteceu.
Ilê Asè Airá Tolami
O Ilê Asè Airá Tolami, localizado em Dias D’Ávila, na região metropolitana de Salvador, já passou por diversos atos de violência. Somente em 2018, o local sofreu cerca de 10 arrombamentos. À época, os casos foram tratados como furtos. “Nos últimos [arrombamentos], eles não levavam mais nada, só quebravam as coisas”, conta Camila Garcez.
No último dia 11, o terreiro sofreu mais um ataque, em que foram depredadas todas as casas de Orixás, também foram destruídos objetos litúrgicos e foram furtados alguns objetos de pequeno valor. Em nota, os filhos e filhas da Casa pedem que haja celeridade na investigação e proteção para eles e para o líder religioso do terreiro, Babalorixá João Marcelo Nobre Odé Tolá.
Edição: Alfredo Portugal