Bahia

Balanço eleitoral

Eleição na Bahia aponta acertos do PT no governo e Congresso, avalia cientista político

O professor Renato Francisquini analisa a eleição dos deputados baianos e desafios para o 2º turno ao governo do estado

Brasil de Fato | Feira de Santana (BA) |
Vantagem de Jerônimo Rodrigues em relação à ACM Neto aponta sucesso de parte da estratégia do PT no estado, aponta professor - Reprodução PT

A Bahia chegou ao 2º turno das eleições para governo com uma importante vitória política da esquerda. Apesar de muitas pesquisas de intenção de voto indicarem o oposto, o candidato do PT, Jerônimo Rodrigues, foi a escolha da maioria dos baianos. O petista obteve mais de 4 milhões de votos, que representam 49,45% dos votos válidos, enquanto o favorito ao cargo, ACM Neto (União Brasil), alcançou 40,80% do eleitorado, pouco mais de 3,3 milhões. 

Apesar da vantagem, a segunda fase do processo eleitoral também traz um cenário complexo para Jerônimo. Para ajudar a compreender esse panorama, os desafios da esquerda neste 2º turno e analisar a nova composição da bancada federal e estadual de deputados, o Brasil de Fato Bahia conversou com Renato Francisquini, professor do Departamento de Ciência Política da UFBA. 

De desconhecido a favorito

Renato destaca que, antes de tudo, é importante considerar que Jerônimo sequer era a primeira opção do PT para a disputa. “Jaques Wagner, cujo governo (2007-2014) foi muito bem avaliado e que se elegeu em 2018 para o Senado com uma ótima votação, despontava como favorito dentro da chapa que governa a Bahia desde 2007. No entanto, por dificuldades relacionadas à manutenção dos partidos que compunham a coalizão de Rui Costa – sobretudo o PP, do vice João Leão – o partido optou pela manutenção de Wagner no Senado e pelo lançamento do ex-secretário de educação do governo Rui Costa. Assim como Rui Costa, Jerônimo não era um nome conhecido da população baiana. O desafio para a campanha do PT no estado, portanto, era duplo: tornar o nome de Jerônimo conhecido e associá-lo ao ex-presidente Lula”, destaca.

Já o principal adversário de Jerônimo, o ex-prefeito de Salvador ACM Neto (União Brasil), teve seu nome construído de forma bem diferente. “Além de ter sido prefeito da capital por dois mandatos, teve mais tempo para costurar a sua candidatura e o apoio de partidos importantes, inclusive alguns dos que apoiaram Rui Costa”. ACM Neto também traz no sobrenome um dos principais elementos que chancelam sua carreira política: ele é neto de Antônio Carlos Magalhães, um dos nomes mais tradicionais da política do estado.

Diante desse cenário, Francisquini avalia que a escolha do PT foi acertada. “As últimas pesquisas para o governo do estado mostravam que a campanha petista vinha conseguindo reverter o quadro inicial e reduzir a vantagem de Neto – aliás, como ocorreu nas eleições de 2006 e 2014. O resultado das urnas demonstram que a estratégia do PT funcionou em parte. O segundo turno começa com uma razoável vantagem do candidato petista”, pontua.

Estratégias para o 2º turno

Além do natural rearranjo das alianças políticas, o 2º turno traz para os candidatos o desafio de lidar com o eleitor que se absteve de votar. Na Bahia, o índice de abstenção foi de 21,35%, um pouco maior do que a eleição geral no país, que alcançou 20,95%. O professor salienta que, embora pareça um número alto, não é possível considerar esse índice um sinal de desinteresse da população. 

“O Brasil registra uma taxa de comparecimento bastante expressiva, se comparado a outros países do mesmo porte. Poderíamos dizer que a manutenção da taxa de não comparecimento, e até um leve aumento, seria frustrante diante de um processo eleitoral dos mais importantes da nossa história”, aponta.

Embora ressalte que seja necessário investigar de forma mais profunda os motivos pelos quais essa parcela da sociedade não compareceu às urnas, Francisquini levanta duas hipóteses para entender essa parcela do eleitorado. 

“O que a literatura mostra é que, em geral, a população de mais baixa renda tende a se abster mais. Se isso for verdade, as campanhas do ex-presidente Lula e de Jerônimo devem se mobilizar para encorajar os grupos menos privilegiados a votarem. Outra hipótese, também a ser verificada empiricamente, sugere que o aumento da violência política pode ter levado as pessoas a não se posicionarem politicamente e, em alguns casos, a não participarem do processo. Nesse caso, caberia ao TSE e aos TREs fazer uma campanha mais incisiva contra a violência política e encorajando a população a exercer o direito ao sufrágio”, sugere.

ALBA segue comandada pela política tradicional

Francisquini também faz um balanço da nova composição da Assembleia Legislativa da Bahia (ALBA). Das 63 cadeiras, 39 deputados estaduais se reelegeram e em 24 houve mudança. O professor ressalta que, mesmo com novos nomes, a correlação de forças na ALBA teve pouca alteração. 

“É importante observar que parte dos novos ingressantes são pessoas de famílias tradicionais ou de candidaturas ligadas a lideranças políticas consolidadas. Na Bahia, não parece ter havido uma mudança substantiva na composição das bancadas. O PT, do atual governador, elegeu 9 deputados, enquanto o União Brasil, de ACM Neto, conquistou 10 cadeiras. O PSD, historicamente próximo do PT no estado, foi também um dos destaques do pleito, na medida em que teve os três candidatos mais votados no estado e 9 cadeiras na Assembleia Legislativa”. 

Diante desse cenário, o novo chefe do Executivo no estado precisará ter capacidade de articulação. “Seja qual for o governador eleito, terá de dialogar com as bancadas para a formação de uma coalizão de governo”, aponta o professor.

Importância da Bahia e do Nordeste

Um dos destaques das eleições para presidente foi o papel da região Nordeste para Lula chegar no 2º turno à frente de Bolsonaro. Com vitória em todos os estados da região, o candidato petista obteve 69,73% dos votos na Bahia. “Assim como ocorreu em 2018, a região Nordeste se mostra mais uma vez um bastião em defesa da democracia e dos direitos sociais”, destaca Renato.

Em relação à Câmara Federal, a bancada da Bahia também mostrou um diferencial em relação a outros estados. O PT foi o partido com maior expressão nessa nova composição, elegendo 7 candidatos. Em segundo lugar vieram o PSD e União Brasil, com 6 nomes cada. O PL, partido de Bolsonaro, elegeu 3 cadeiras. O cientista destaca também a vitória da chapa de Jerônimo para o Senado.

“Se, nacionalmente, vimos um avanço do bolsonarismo no legislativo (considerando, sobretudo, a Câmara dos Deputados e o Senado Federal), não é possível dizer o mesmo para a Bahia. Além de ter eleito uma bancada significativa para a Câmara, a chapa de Jerônimo e do ex-presidente Lula venceu com folga a disputa para o Senado, com Otto Alencar, que teve quase 60% dos votos válidos”.

Por fim, Renato salienta que, caso Lula seja eleito, esses nomes terão um papel decisivo na governabilidade do presidente. “O apoio dos governadores e das bancadas eleitas pelos estados da região será fundamental para que um eventual governo Lula possa implementar sua agenda no Legislativo. A bancada progressista terá um papel crucial para dar sustentação ao governo Lula, para reconquistar direitos perdidos desde o golpe parlamentar de 2016 e para desconstruir as políticas de liberação de armas e munições, entre outros retrocessos realizados pelo atual governo”, conclui.

Edição: Kleybson Ferreira