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Coluna

Universidade num contexto de Economia criativa, reindustrialização verde e Revolução 4.0 – P. 4

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É preciso aliar uma concepção de Universidade de qualidade e excelência com uma visão de mundo e de ser humano. - Mídia Ninja
A Universidade é um espaço de disputa e expressa a correlação de forças sociais

No quarto artigo da série que reflete sobre um futuro projeto de Universidade, avaliaremos o financiamento da Educação Superior, a meta 12 do Plano Nacional de Educação (PNE) e a tensão entre os modelos público e privado. A meta 12 do PNE estabelece: “Elevar a taxa bruta de matrícula na educação superior para 50% (cinquenta por cento) e a taxa líquida para 33% (trinta e três por cento) da população de 18 (dezoito) a 24 (vinte e quatro) anos, assegurada a qualidade da oferta e expansão para, pelo menos 40% (quarenta por cento) das novas matrículas, no segmento público.”

O objetivo de ter 40% (quarenta por cento) das novas matrículas no segmento público gerará uma necessidade de expansão maior do que a proporcionada pelo Programa de Reestruturação das Universidade Federais do governo Lula (REUNI). A taxa líquida de escolaridade superior (jovens de 18 a 24 anos no ensino superior) em 2013 foi de 18%, o que significava 7.526.681 de matriculados em todos os estabelecimentos de ensino. Hoje ela chega a 21 %, mas o número de alunos nas federais se manteve estável de 2013 até hoje. Analisando a taxa de 2013 e levando em consideração que a taxa líquida de escolaridade superior em 2024 terá que ser de 33%, isso significará 13.798.916 de matriculados, se considerarmos a população atual. Isso demandará um aumento de matrículas de 6.272.235 jovens, sendo que o setor público deve ter 2.508.894 novas vagas, que é 40% desse total, então as universidades públicas deverão ter um aumento de 150% nas vagas até 2024.

Torna-se imperioso que a União aumente os recursos para a Educação Superior, ao mesmo tempo em que deve respeitar a projeção de aumento de investimentos previstos para a Educação Básica pelo Novo Fundeb, aprovado em dezembro de 2020. As distintas metas e estratégias do PNE exigem uma prioridade muito forte para a Educação Superior, a Educação da creche ao ensino médio, o ensino profissional tecnológico e a Educação de Jovens e Adultos. Isso demandará a adoção de um projeto de desenvolvimento econômico que revogue o teto de gastos, a emenda constitucional 95 e recoloque o Estado como grande planejador e indutor do desenvolvimento, para que se criem as condições de um novo ciclo de investimento em políticas sociais.

Entretanto, a partir de 2016, quando houve o ponto mais alto do orçamento das universidades, começou uma redução constante do orçamento de custeio e capital, então o desafio para uma mudança na política pública envolverá uma recomposição dos recursos, além da necessidade de aumento para ampliação da rede.

Uma opção para ampliar a rede federal de Educação Superior pode estar na adoção dos bacharelados interdisciplinares e de novas estratégias de ensino-aprendizagem e arquiteturas curriculares. O objetivo de aprofundar essa e outras experiências pode ser a viabilização para ampliar a oferta de vagas, mas não deve ser apenas isso, mas um projeto de Universidade com uma visão que englobe a inclusão social, o acesso e permanência, mas também e principalmente uma concepção de Universidade de qualidade e excelência, articulada com uma visão de mundo e uma visão de ser humano. A Universidade é um espaço de disputa, assim como a Cultura e as Artes, e expressa a correlação de forças sociais de um determinado momento histórico, podendo estar mais articulada com um projeto de sociedade mais conservador ou libertador.

As políticas do período de 2003 a 2016, que não foram ainda completamente desmontadas entre 2016 e 2022, indicam naquele período um investimento superior na Educação Pública, estímulo à pós-graduação e à pesquisa, um fortalecimento das atividades de extensão, atualização das diretrizes curriculares dos diferentes cursos com um viés mais sintonizado com uma formação crítica e reflexiva dos alunos, uma formação mais integral e comprometida com a justiça social e com um desenvolvimento sustentável social, econômico e ambiental. Apesar disso, simultaneamente foram ampliados os investimentos no Financiamento Estudantil (FIES) e criado o PROUNI para as instituições privadas, recursos que ampliaram a inserção dos alunos no ensino superior. Entretanto, foi um recurso público que poderia ser investido no setor público para aumentar as vagas e garantir uma formação de melhor qualidade e de caráter mais questionador e libertador. Foi priorizada, como medida pragmática, a ampliação do acesso como um todo, nos sistemas público e privado, justificada com o fato de que os níveis de inserção dos jovens e mais adultos no início do primeiro governo Lula eram muito baixos. 

Hoje, torna-se imprescindível reorientar essa política, pois nos anos dos governos do PT a expansão do setor privado foi maior do que nos governos do PSDB; embora tenha havida uma expansão significativa das vagas e um fortalecimento institucional do ensino público, da pesquisa, da extensão, das ações afirmativas e um avanço científico acelerado do Brasil no panorama mundial, por conta das universidades públicas. A maior parte das vagas se concentraram no setor privado, que não tem em sua quase totalidade atividades de pesquisa e extensão e seus professores continuam a ser horistas, numa relação precarizada de trabalho. 

A formação dos alunos num ambiente privado vem carregada, eivada, de uma relação de consumo e de mercado, com faculdades/empresas que veem os alunos como clientes e a interação entre alunos e instituições passa a ser de consumo, contratual, jurídica. Esse ethos forma pessoas para a competição, com uma visão desprovida de uma compreensão social, política e cultural mais ampla e que reproduz o agir, o sentir e o pensar do regime capitalista. Fortalece uma determinada concepção de “empreendedorismo” que responsabiliza exclusivamente o aluno pelo seu “sucesso” ou fracasso, desconhecendo que as variáveis sociais e as condições macroeconômicas são determinantes para o desempenho de determinados empreendimentos, e muitas vezes escondendo por trás dessa capa de empreendedorismo uma situação de trabalho precarizada, “uberizada”, que classifica relações de ultra exploração como de empreendedorismo. Uma formação pouco crítica, mais voltada para o treinamento do que para a constituição do ser humano, do cidadão, do cientista, do pesquisador ou do artista, que desconhece até as visões mais amplas e modernas de setores do empresariado comprometidos com o desenvolvimento sustentável (no tripé econômico, social e ambiental). Essa pedagogia “privada” preconiza um aligeiramento da formação entendida como adestramento, e está em desacordo com as diretrizes curriculares nacionais (DCN) que foram conquistadas nas resoluções do Conselho Nacional de Educação mais recentemente. 

 

*Este é um artigo de opinião. A visão dos autores não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

Edição: Lorena Carneiro