No próximo sábado (19), vai ser realizado o ato em defesa das Dunas do Abaeté, no bairro de Itapuã, em Salvador. A concentração será às 9h. A iniciativa dos Terreiros Abasá de Ogum e Ilê Maa Ase Ni Ode e do Instituto Odara tem o objetivo de protestar contra a falta de diálogo da Prefeitura com a comunidade sobre o projeto de urbanização em curso no parque.
Jaciara Ribeiro, Yalorixá do Axé Abasá de Ogum e ativista da luta contra a intolerância religiosa, argumenta que "o projeto de urbanização do Parque Metropolitano Abaeté não contempla a diversidade. A gente é contra uma obra de mais de cinco milhões de reais que não agrega toda a comunidade. Primeiro teve o projeto de lei que a gente conseguiu derrubar, que seria para mudar o nome do local. Agora está sendo construído um espaço que vai macular tudo que a gente acredita. A Lagoa do Abaeté é um espaço de ancestralidade e precisa ser preservado. Não foi convocada nenhuma reunião para sabermos o que seria essa construção, e ela agride todos os direitos do povo de religião de matriz africana".
Entenda o caso
No último dia 10 de fevereiro, o prefeito de Salvador, Bruno Reis (DEM), anunciou detalhes do projeto em uma visita ao bairro. A proposta da obra é que a urbanização ocorra em uma área de 5.654 m², sendo 1.900 m² de área construída, onde serão instalados uma sede administrativa, sanitários, estacionamento e um núcleo de orientação ambiental com auditório para 50 pessoas.
No bojo desta proposta, o vereador Isnard Araújo (PL) - ligado à Igreja Universal- sugeriu renomear o local para "Monte Santo Deus Proverá". Diante das manifestações populares e parlamentares contrárias, o vereador recuou. Em pronunciamento na tribuna no dia 15 de fevereiro, ele retirou o projeto de lei da votação.
A Yalorixá Jaciara explica que o diálogo com a Prefeitura só aconteceu depois da divulgação do projeto e que "tanto Ministério Público quanto alguns vereadores, alguns movimentos da comunidade têm pedido audiência para poder dialogar e para embargar essa obra. Mas ainda não foi dado nenhum retorno. Tanto que, atualmente, a obra está sendo conduzida naturalmente. É muito triste", lamenta.
Sobre a força simbólica do Abaeté, Jaciara observa que o local tem forte representação para os povos de terreiro. "Ele guarda muitos segredos e é um espaço sagrado para todos os terreiros daqui da comunidade e adjacências. Na verdade, a Lagoa do Abaeté é a morada de Oxum. A gente tem a mata onde cultivamos as ervas para rituais e fazemos as oferendas de acordo com a proteção do meio ambiente. A gente não vai lá arrancar toneladas de folhas, a gente não vai lá colocar lixo. A gente sabe fazer uma oferenda a partir da natureza para a natureza", pontua.
Marta Rodrigues, vereadora de Salvador pelo Partido dos Trabalhadores (PT), também demonstra preocupação com o projeto de urbanização em curso. "É um desrespeito com a cidade de Salvador e com toda a cultura que ela carrega em sua existência. Tivemos na última segunda-feira (14), um encontro [na Câmara de Vereadores] com o secretário de infraestrutura, quando externalizamos toda a gravidade desta obra. A pergunta que todos nós estamos fazendo e querendo resposta: este projeto atende a quem?", questiona.
A vereadora destaca ainda que existem fatores complicadores para a execução da obra: "São muitos os problemas envolvidos. Primeiro no âmbito da legalidade, ele está sendo realizado em uma área de proteção ambiental que está situada em dois zoneamentos, a Zona de Proteção Visual (ZPV) e a Zona de Ocupação Controlada (ZOC). Ou seja, requer um cuidado maior. Não pode ter supressão de vegetação, nem instalações que aumentem a frequência de pessoas, justamente para não comprometer o sistema de proteção. No âmbito cultural, de pertencimento e da identidade da primeira capital do Brasil, é uma obra que não houve discussão com a sociedade, não nos foi apresentado estudo de impacto".
Mobilização
Uma representação foi entregue ao Ministério Público da Bahia pela Frente Parlamentar Mista Ambientalista, a mandata coletiva Pretas por Salvador (PSOL) e algumas entidades. No documento, são apresentadas possíveis irregularidades no projeto.
Para Jaciara Ribeiro, o ato do sábado é importante para demarcar a força das mulheres na resistência e preservação do local. "A expectativa é chamar atenção da sociedade e do poder público e mostrar a unidade que a gente tem em relação a preservar esse local. Vamos de branco e faremos uma oferenda. Levaremos rosas e tocaremos nossos instrumentos para dizer que nós somos mulheres que acreditam em transformação. Mulheres que se movem para poder transformar", destaca.
Edição: Elen Carvalho