Movimentos sociais, comunidades de terreiros e organizações lançaram, na manhã desta quarta-feira (23), um manifesto em defesa do Parque São Bartolomeu. O parque, localizado em Salvador, está presente no Programa de Concessão de Unidades de Conservação de parques naturais, lançado no final de 2020, pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
Apresentado pela Frente em Defesa Popular do Parque São Bartolomeu, com mais de 50 assinaturas, o manifesto demonstra preocupação e repúdio com o plano de concessão. “As organizações da sociedade civil, por meio da Frente em Defesa Popular do Parque São Bartolomeu vêm a público manifestar preocupação e repúdio com o plano de privatização do Parque São Bartolomeu à iniciativa privada”, diz trecho do documento.
Além do Parque de São Bartolomeu, estão na lista para concessão: Parque Estadual das Sete Passagens (localizado em Miguel Calmon); Parque Estadual da Serra do Conduru (entre Ilhéus, Itacaré e Uruçuca); Parque Metropolitano de Pituaçu e o Parque Zoobotânico Getúlio Vargas, ambos em Salvador.
“O Parque São Bartolomeu área de proteção ambiental, patrimônio material, imaterial e histórico de Salvador, da Bahia e do Brasil, posto que foi o espaço ocupado pelo quilombo do urubu, um dos mais fortes centros de refugiados negros no século XIX na Bahia, além de compor o cenário inicial da independência do nosso País”, afirma o manifesto. Que também ressalta a importância do parque para as religiões de matriz africana enquanto santuário e espaço litúrgico. “É considerado um santuário para as religiões afrodescendentes, compostos de sete cachoeiras, localização geográfica, na borda oriental da bacia do recôncavo. O Parque São Bartolomeu possui uma considerável área de floresta ombrófila densa - remanescente da Mata Atlântica, composta por uma diversidade de vegetação que é utilizada no culto afro-brasileiro e para fins medicinais”.
O manifesto denuncia que o parque vem sendo abandonado pelos poderes públicos municipais e estaduais. “Exemplos disso são evidentes, entre eles, o contrato de manutenção, conservação e engenharia do Parque São Bartolomeu, de R$1.800,00 (um milhão e oitocentos mil reais), mas o que se constata é o abandono deliberado do Parque”, relata outro trecho.
As organizações defendem que é um equívoco que a área seja utilizada para atender aos interesses privados. “A continuidade do direito ao lazer, à preservação religiosa e a cultura popular não podem ser submetidos aos interesses do lucro empresarial. O bem público é para todos e todas, o privado é para poucos”. E por fim exigem “que o executivo estadual desista do programa de concessão à iniciativa privada do Parque São Bartolomeu e abram diálogo com a população para que a gestão participativa da unidade de conservação seja fortalecida”.
Confira abaixo o manifesto na íntegra:
Manifesto em defesa do Parque São Bartolomeu
As organizações da sociedade civil, por meio da Frente em Defesa Popular do Parque São Bartolomeu vêm a público manifestar preocupação e repúdio com o plano de privatização do Parque São Bartolomeu à iniciativa privada, como parte do Programa de Concessão de Unidades de Conservação de parques naturais, lançado no final de 2020 pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), com apoio do governo da Bahia.
Para assegurar o direito à terra e a preservação de sítios sagrados, como o Parque São Bartolomeu, aos remanescentes de comunidades de quilombos e indígenas, o Brasil ratificou a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho, (OIT), em 2003. Este documento de nível internacional ressalta a importância e o direito de consulta prévia, como
pondera no artigo 5°, “deverão ser adotadas, com a participação e cooperação dos povos interessados, medidas voltadas a aliviar as dificuldades que esses povos experimentam ao enfrentarem novas condições de vida e de trabalho.”.
A Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais, (PNPCT), instituída pela Presidência da República, por meio do decreto 6.040
de 2007, afirma no artigo 3°, inciso II a importância do reconhecimento e preservação dos territórios sagrados e tradicionais, “os espaços necessários a reprodução cultural, social e econômica dos povos e comunidades tradicionais, sejam eles utilizados de forma permanente ou temporária, observado, no que diz respeito aos povos indígenas e quilombolas”. Assim como ressalta, a garantia do “reconhecimento, a valorização e o respeito à diversidade socioambiental e cultural dos povos e comunidades tradicionais”. No começo de fevereiro fomos surpreendidos com a visita ao parque de coordenadores do Instituto de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (INEMA) com o objetivo de iniciar os estudos de viabilidade econômica para demonstração ao setor privado.
Além do Parque de São Bartolomeu, pelos planos do Governo do Estado e do BNDES também estão no plano de concessão a Serra do Conduru - entre Ilhéus, Itacaré e Uruçuca -, Parque das 7 passagens - localizado em Miguel Calmon - e o Jardim Botânico e o Parque de Pituaçu, em Salvador. O Parque São Bartolomeu área de proteção ambiental, patrimônio material, imaterial e histórico de Salvador, da Bahia e do Brasil, posto que foi o espaço ocupado pelo quilombo do urubu, um dos mais fortes centros de refugiados negros no século XIX na Bahia, além de compor o cenário inicial da independência do nosso País. É considerado um santuário para as religiões afrodescendentes, compostos de sete cachoeiras, localização geográfica, na borda oriental da bacia do recôncavo. O Parque São Bartolomeu possui uma considerável área de floresta ombrófila densa - remanescente da Mata Atlântica, composta por uma diversidade de vegetação que é utilizada no culto afro-brasileiro e para fins medicinais. As comunidades ao redor do parque, historicamente, sempre utilizam sua rica floresta como catadores de frutas, folhas das espécies das matas para o sustento e comercializam nas feiras livres e lojas de produtos afro-brasileiros, como meio de sobrevivência.
O Parque São Bartolomeu é um espaço litúrgico e natural, com uma rica biodiversidade, contudo que vem sendo abandonada deliberadamente pelos poderes públicos municipais e estaduais. Exemplos disso são evidentes, entre eles, o contrato de manutenção, conservação e engenharia do Parque São Bartolomeu, de R$1.800,00 (um milhão e oitocentos mil reais), mas o que se constata é o abandono deliberado do Parque.
O poder público comete enorme equívoco de pretender utilizar esta área para atender interesses privados. A continuidade do direito ao lazer, à preservação religiosa e a cultura popular não podem ser submetidos aos interesses do lucro empresarial. O bem público é para todos e todas, o privado é para poucos.
Esta ação do Governo Rui Costa (PT) da Bahia revela a falta de compromisso social com o
Parque São Bartolomeu, seguindo a linha da atual gestão do Ministério do Meio Ambiente, do Governo Bolsonaro (sem partido), que desestrutura toda a sociedade brasileira de forma sistêmica com o apagamento das áreas culturais e ambientais de todo País.
Os movimentos sociais, grupos culturais e entidades religiosas frente a essa ameaça se unificaram e construíram a Frente em Defesa Popular do Parque São Bartolomeu, cujo caráter de atuação é ser uma unidade suprapartidária que visa a continuidade desse bem comum público natural e popular. E garantir a livre entrada a este patrimônio, material, imaterial e histórico de forma gratuita para que todos e todas possam acessar.
Portanto, as organizações da sociedade civil abaixo-assinadas exigem que o Executivo Estadual desista do programa de concessão à iniciativa privada do Parque São Bartolomeu
e abram diálogo com a população para que a gestão participativa da unidade de conservação seja fortalecida, visando a proteção da biodiversidade e a relação com as comunidades ao seu entorno. Garantido com isso, a melhor relação entre ser humano e a natureza.
Assinam este manifesto:
1. Articulação de Mulheres Negras Quilombolas do Engenho da Ponte
2. Associação Beneficente e Religiosa Filhos de Flaviana Bianc - Terreiro do
Cobre
3. Associação Nacional Cultural de Preservação do Patrimônio Bantu -ACBANTU
4. Associação Onzò de Angorô
5. Associação Pássaros das Águas
6. Afoxé Filhos de Ogun De Ronda
7. Afoxé Kambalageanze
8. Canteiros Coletivos
9. Centro Cultural Que Ladeira é Essa?
10. Coletiva Mahin - Organização de Mulheres Negras
11. Coletivo de Mulheres Negras - Abayomi
12. Coletivo de Entidades Negras
13. Coletivo Mobicidade Salvador
14. Coletivo Incomode
15. Coletivo Resistência Preta
16. Conselho Municipal da Comunidade Negra
17. Conselho Estadual da Comunidade Negra
18. Conselho Estadual APA
19. Conselho Pastoral dos Pescadores
20. Consulta Popular
21. Egbé Asé Onã Osun
22. Ẹgbẹ Orúnmìlà Àti Obàtálá Adéṣinà Ifakundayọ
23. Fórum Marielles - Movimento de Mulheres Negras
24. Frente Nacional Makota Valdina
25. Gambá - Grupo Ambientalista da Bahia
26. Grêmio Cultural e Religioso Omo Ogun da Senzala Religiosa MUKKUNDEWÁ
27. Grupo de Jovens Liberdade Já
28. Grupo de Mulheres do Rio Sena
29. Irmandade Religiosa e Beneficente de Ojes, Ogans e Tátas - SIOBÁ
30. Ilê Axé Abassá de Ogum
31. Ilê Axé Kossô Konan
32. Ilé Axé Torrun Gunan
33. Ilê Axé Onirê Unxê Omi Oyá
34. Ilê Axé Araká
35. Informe Nordeste
36. Levante Popular da Juventude
37. Movimento de Cultura Popular do Subúrbio
38. Movimento dos Trabalhadores e Trabalhadoras por Direitos
39. Movimento de Sem Teto da Bahia
40. Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA)
41. Movimento dos Atingidos por Barragens
42. Movimento Viva o Parque Pituaçu
43. Movimento pela Soberania Popular na Mineração
44. Mesa de Ogan
45. Nzó Mutà Lombô ye Kaiongo
46. Nzo kwa Mpaanzu
47. Observatório da Mobilidade de Salvador
48. Programa a Voz Do Axé oficial
49. Papo Ancestral
50. Quilombo Educacional e Curso Pré-Vestibular Ana Santos
51. Rede de Mulheres Negras da Bahia
52. Rede de Mulheres de Terreiros
53. Rede Religiosa de Matriz Africana - RREMAS
54. Revista Aglomeradores
55. Rede Kôdya
56. Terreiro Mameto Kalunga
57. Terreiro Humpayme Dan
58. Vozes que Invocam
Edição: Jamile Araújo