O estado da Bahia recebeu, na manhã desta sexta-feira (26), mais 347 mil doses de vacinas contra a Covid-19, segundo informações da Secretaria Estadual de Saúde (SESAB). A secretaria relatou que são 141 mil doses da vacina da AstraZeneca e mais 206 mil doses da Coronavac, produzida pelo Instituto Butantan. Com a chegada dessa remessa, a Bahia recebeu o total de 2.386.600 doses de vacinas desde o dia 18 de janeiro. Até as 15 horas de hoje (26), a Bahia totalizava 1.265.404 vacinados contra a Covid-19, dos quais 305.126 receberam também a segunda dose, sendo o quarto estado do país com o maior número de imunizados.
Apesar desses números, questionamentos têm sido levantados por pesquisadores, movimentos sociais, entidades e políticos. Entre eles, o ritmo da vacinação no país estar abaixo do necessário para haver combate efetivo ao avanço e letalidade da Covid-19, uma vez que o número de óbitos no Brasil ultrapassou os 300 mil nesta semana.
Outro ponto é o agravamento das crises social e econômica que a população enfrenta com as restrições de atividades e consequente impossibilidade de trabalhar em alguns setores, o que torna a fome e a vulnerabilidade social realidades para os brasileiros. Além do iminente colapso do sistema de saúde e profissionais de saúde sobrecarregados, com a insuficiência de leitos de UTI.
A experiência brasileira em desenvolvimento de vacinas e imunização
Livia Angeli Silva, professora da Universidade Federal da Bahia (UFBA), diz que o Brasil tem uma das experiências mais exitosas e reconhecidas do mundo no quesito vacinação, com institutos de pesquisa e laboratórios públicos que garantem autonomia do estado em relação ao setor produtivo privado.
“O Brasil, portanto, tem uma capacidade em potencial para produzir vacinas, tanto no desenvolvimento da tecnologia, como na capacidade produtiva em si mesma. Mas óbvio que isso depende constantemente do investimento em políticas estruturantes no âmbito da ciência e tecnologia, quanto de priorização da indústria de base para fornecimento de materiais necessários a essa produção”, destaca.
Lívia, que também é vice-presidente do Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (CEBES), pontua que desde 2017 o país tem sofrido com desinvestimento no complexo produtivo da saúde e vem se tornando mais dependente do mercado externo. “Mas ainda assim, o trabalho sério e reconhecido internacionalmente dos gestores e pesquisadores de nossos institutos (Butantan e Bio-Manguinhos/ FIOCRUZ) permitiu a importação de tecnologia por meio de parceria com instituições estrangeiras”. E completa: “Ainda com essas restrições, nossas instituições consolidadas têm condição de cumprir o seu papel e precisamos difundir isso, defendê-las dos ataques irresponsáveis e exigir do governo que garanta as condições para essa produção que vai acelerar a disponibilização de vacinas para todos no Brasil”.
Politização das vacinas e desafios para imunização no Brasil
Para Lívia, são muitos os desafios hoje para a imunização da população brasileira contra o SARS-CoV-2. “Vão desde a geopolítica mundial e disputa desigual na aquisição de insumos entre as grandes potências e países periféricos, até a forma como o governo brasileiro conduziu o processo e nos colocou em uma posição no jogo muito mais desfavorável do que deveríamos estar”, pontua.
A professora ressalta: “Nossa chance era justamente apostar em nossa capacidade produtiva e que o governo federal não o fez de forma responsável, preferindo apostar em práticas e discursos sem bases científicas, os quais além de desperdiçar dinheiro público, contribuiu para a desinformação da população”.
Lívia acredita que banalizando a morte de mais de 300 mil brasileiros, o governo buscou legitimidade na desqualificação das vacinas produzidas, para esconder o que de fato é o problema mais grave: não ter vacina para todos. “Desse modo, tem-se um problema grave e multifacetado que envolve a escassez real de vacinas no momento, a baixa capacidade técnica e falta de disposição política do governo federal para resolver o problema e uma rede de informações falsas que tem desencorajado uma parte significativa da população a buscar e exigir o direito à vacina”.
Comitê Vacina pelo SUS já!
“O Comitê Baiano Vacina no SUS já! é uma mobilização pela vida, um coletivo formado para organizar a luta pela vacinação de toda a população contra a Covid-19 pelo Sistema Único de Saúde (SUS)”, conta Ronalda Barreto Silva, professora da Universidade do Estado da Bahia (UNEB) e coordenadora da Associação dos Docentes da Universidade do Estado da Bahia (ADUNEB).
De acordo com Ronalda, o comitê é formado por representantes da sociedade civil, entidades de saúde, universitárias, frentes sindicais, movimentos sociais e religiosas, com o objetivo de ampliar o debate sobre a pandemia e monitorar as ações dos poderes públicos na definição das medidas para imunização da população. “Nossa função é também formular propostas que contribuam no sentido de avançar no enfrentamento da atual situação epidemiológica da Bahia e de Salvador. Desde sua criação, em janeiro, o Comitê tem realizado debates com especialistas e audiências com as autoridades e diversas movimentações políticas em torno da vacinação, articuladas com todos os segmentos que integram o coletivo”, caracteriza.
Ronalda afirma que o comitê avalia que, assim como os demais estados da federação, a Bahia está com a vacinação lenta, o que aprofunda a tragédia vivida na pandemia. “A interferência política nas campanhas de vacinação está custando vidas. O Brasil se negou a adquirir a vacina no tempo certo, quando outros países estavam adquirindo e só em outubro de 2020 fez contrato de transferência de tecnologia da Oxford/Astrazeneca, apostando só nessa vacina. A pressão estabelecida pela liberação da Coronavac/Butantã trouxe essa possibilidade que ainda é insuficiente para a Bahia e para o Brasil”, observa.
Considerando que o combate à covid-19 reside nas medidas restritivas e na vacinação, Ronalda alega que a situação da Bahia e demais estados do Brasil é grave: “Sobretudo porque a demora na vacinação possibilita mutações do vírus e surgimento de novas variantes”. E reitera: “as tentativas de acelerar a vacinação têm sido impedidas por medidas do governo federal que militarizou o Ministério da Saúde, trazendo dificuldade para o trabalho da área técnica, cometendo absurdos como indicar medicação preventiva que podem causar reações graves na população, como arritmias cardíacas, enfarto e hepatite medicamentosa”.
Entre as propostas do comitê, Ronalda ressalta: “A principal proposta do Comitê Baiano Vacina no SUS já! é formar uma grande coalizão pela desmilitarização do Ministério da Saúde, devolvendo a pasta aos sanitaristas e gestores comprometidos com o SUS; que defenda um plano emergencial de vacinação, com vacina suficiente para todos e investimentos na área científica - é desumana a disputa etária que existe hoje pelas duas doses da vacina; pela aprovação imediata do auxílio emergencial de 600 reais para a população vulnerável; e pela ampliação das medidas sanitárias, especialmente na vigilância em saúde, para atuação nos territórios, monitorando a circulação do vírus, com objetivo de conter sua disseminação”.
SESAB aposta na ampliação da imunização com a Sputnik V se houver autorização da ANVISA
Segundo a SESAB, o plano de vacinação da Bahia segue as diretrizes no plano nacional de imunização e o avanço nas fases depende muito do cronograma de chegada das vacinas e quantitativos a serem recebidos em cada semana.
Na última terça-feira (23) a Bahia ultrapassou a marca de 1 milhão de baianos vacinados com a primeira dose da vacina contra o novo coronavírus. O secretário da Saúde da Bahia, Fábio Vilas-Boas, acredita que o número de vacinados representa uma esperança para a sociedade e que com a chegada da vacina Sputnik V adquirida pelo governador Rui Costa, será possível avançar mais rápido na imunização.
Vilas-Boas afirma que com a chegada de 9,7 milhões de doses da Sputnik V a partir de abril, se houver a autorização da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), “será possível imunizar todos os idosos acima de 60 anos e profissionais das áreas de educação e segurança”.
É possível acompanhar aqui a cobertura vacinal da covid-19 na Bahia.
Edição: Elen Carvalho