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É preciso derrubar a Emenda 95

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Sem investimento no SUS, além dos auxílios emergenciais, as periferias de nosso país não sustentarão nem se protegerão. - Reprodução
Pedir só o isolamento social não dá conta das periferias

A Universidade Federal da Bahia (UFBA) publicou um relatório recente, a partir dos microdados do Censo 2010 e Pesquisa Origem-Destino do Governo do Estado, que aponta o óbvio para quem conhece as ruas e a periferia soteropolitana: os bairros apertados, com maior contingente populacional em menores metro quadrados, serão os mais afetados pelo coronavírus.
São neles onde estão as ruelas, os becos, as escadarias mal feitas, onde os meninos jogam futebol, os idosos jogam dominó, o vai e vem permanece na luta cotidiana de sobrevivência. Dez em cada dez infectologistas do planeta dizem que uma ação básica para evitar a contaminação pelo vírus Covid-19 é evitar as aglomerações, ou seja, mostra que o isolamento é de fato essencial para a contenção da pandemia. 
Mas na periferia a realidade é  completamente diferente  daquela grande parte da classe média que, de seus apartamentos e casas, protegidos e confortáveis,  fazem lives e à noite batem panela  contra o governo Bolsonaro. 
Em um artigo do cientista da FioCruz, o médico sanistarista Valcler Rangel nos alerta que a dinâmica social na favela é outra: é passar 365 dias em um ambiente aglomerado, considerado pelo IBGE como "aglomerados subnormais". São questões simples: falta de condições mínimas de habitação. 
O movimento nas ruas da periferia, o comércio, a ajuda de uma vizinha a outra vizinha, não tem como parar, pois isso é o que alimenta as comunidades carentes. Sem apoio, sem verba, sem assistência, sem condições dignas de habitação, o isolamento social parece à essa população uma prisão e um sacrifício que a elite brasileira chocada com o coronavírus não deve nem sonhar. 
 A pesquisa da UFBA, que coletou dados até 23 de março, diz que, em Salvador, bairros do Tororó, Vila Canária, Santa Cruz, Pirajá, Nova Constituinte, Santa Luzia, Boa Vista de São Caetano e Sussuarana estão entre os principais alvos. São aglomerados subnormais, assim como o Subúrbio Ferroviário e Miolo, onde os índices de pobreza são historicamente mais elevados. Como se não bastasse, são regiões, como várias, que sofrem com outros surtos de dengue, chikungnya e zika. 
Diante desse cenário, onde o governo federal nada faz, colocando  em prática a necropolítica tão falada por Aquile Mbembe, o trabalho dos legislativos faz-se urgente e ágil, com proposições aos executivos municipais. Mas é necessário um movimento nacional de larga escala e urgente pela derrubada da Emenda 95, liberando imediatamente R$ 5 bilhões para o SUS que o governo quer travar. 
As periferias de nosso país e de nossas capitais não sustentarão nem se protegerão se, para além dos auxílios, não tiver um investimento pesado em saúde e saneamento básico que pode ser feito com a verba travada pela PEC do Teto de Gastos. É preciso além do básico - como água, materiais de hignienização e etc -  um foco diferenciado nas comunidades, aumentando agentes de saúde , identificação de áreas de risco e estabelecendo uma prioridade no atendimento do SUS . Enquanto esse povo padece de muito apoio para não ser o maior contaminado pelo coronavírus, a uma elite cabe apenas limpar as mãos com álcool gel, usar lenço de papel, isolar os doentes em um dos cômodos das casas. 
Na periferia, ficar em casa nem sempre é sinônimo de proteção - vide o aumento da violência doméstica - tampouco de conforto, quando se tem que dividir um pequeno vão com mais de cinco a seis pessoas de uma família. E muito menos de higiene, quando, em muitas residências, sequer tem água tratada. 
Diante de todas estas questões, é o momento em que os governantes devem parar para refletir e fazer valer o planejamento urbano de nossas cidades, para que futuramente, caso novas pandemias venham a nos afetar, nós não soframos com os mesmos problemas de agora, consequências da falta de saneamento básico e de habitação digna para a população mais pobre.  Vamos enfrentar tudo isso de cabeça erguida e com altruísmo, mas é fundamental que esta pandemia sirva de exemplo para melhorias nas periferias e favelas de nossas cidades. 
Solidariedade é fundamental, estratégias também, mas é urgente a derrubada da Pec dos Gastos para dar o avanço que o Brasil precisa nesse combate à pandemia.

Edição: Elen Carvalho