Bahia

ODÒ YÁ

Milhares de pessoas homenageiam Yemanjá em Salvador

A tradição do presente remonta o século 20 e se mantém e renova a cada ano

Salvador (BA) |
A festa de Yemanjá, reconhecida este ano como Patrimônio Cultural de Salvador, é a única festa do nosso calendário que homenageia um orixá,. - Jamile Araújo

Em Salvador, "cidade que todo mundo é D'Oxum", como canta Gerônimo, no dia dois de fevereiro, milhares de pessoas de branco saudaram 'Yemonjá', a mãe cujos filhos são peixes, a Rainha do Mar. A festa de Yemanjá, reconhecida ,recentemente, como Patrimônio Cultural da cidade de Salvador, é uma das festas populares que representam a fé e do povo baiano. É a única festa de nosso calendário que homenageia um orixá. As demais envolvem elementos sincréticos, que mesclam o dia de homenagens a santos católicos associados aos orixás das religiões de matriz africana, e estão relacionados às estratégias de resistência criadas pelos negros durante a escravização e colonização, na tentativa de preservar o culto às divindades africanas.

Organizada pela Colônia de Pescadores, a tradição do presente para Yemanjá remonta o século 20, e se mantém e renova a cada ano. Inicia com a alvorada às cinco horas da manhã, mas o bairro do Rio Vermelho já está lotado desde a noite anterior. Bem cedo, forma-se uma enorme fila para quem quer colocar o presente para que os pescadores levem ao mar no cortejo oficial, que sai na tarde deste dia. O branco das vestes, as flores, outros presentes, a emoção, pessoas de todas as idades, credos, bairros, cidades, estados, tons de pele e textura de cabelo: todas para saudar Odò Yá (Mãe das Águas), a que cuida de nosso Ori (cabeça).

Stella Maris, cantora e proprietária do Espaço Cultural Casa da Mãe, que fica em frente a Colônia de Pescadores e a Casa de Yemanjá, no Rio Vermelho, explica que a Casa da Mãe vai fazer 14 anos e é por ser filha da Rainha do Mar que o espaço tem esse nome, em homenagem ao Orixá. “Sou artista do cenário independente e abri a casa exatamente para estar movimentando a cena. Estar aqui no Rio Vermelho, achar essa casa aqui, foi um presente dela também. Estou participando todos os anos. A gente tem que saber o que colocar no mar. Eu peço que as pessoas tragam as coisas, faço o balaio, com coisas que são do fundamento como grãos, e por cima são flores e coisas que são biodegradáveis. Não vai perfume e nem espelho. A intenção é a fé dos pedidos, mas nada que prejudique o mar. Essa é uma campanha que a gente já faz há muitos anos”, afirma.

A artista acredita que a festa é a mais linda e que mais representa a cultura baiana. “Porque tem muitas lavagens aqui, mas essa festa traz essa parte da fé que eu acho que as outras festas não tem. Tem uma fila que forma desde o dia primeiro aqui na frente para poder levar o presente, para os pescadores levarem para o mar. E eu não vejo isso em nenhuma outra festa na Bahia e em lugar nenhum. Ela é a que tem a maior representatividade da fé. Vários terreiros estão aqui durante o dia, várias comunidades. Fora as pessoas que têm fé e não são do candomblé, mas trazem uma rosa e pegam a fila de horas para botar o presente. É muito emocionante estar aqui todo ano e presenciar isso, ter essa vista privilegiada, é minha fé, minha devoção” conclui.

Joana Astro, estudante de Gastronomia e natural de Alagoinhas, foi para o “presente” de Yemanjá pela primeira vez, apesar de morar em Salvador há sete anos. Gostou muito de participar da festa e diz que pretende estar novamente. “Foi uma experiência linda, na qual pude me perceber transbordando alegria ao ver uma grande quantidade de pessoas na beira do mar, na madrugada de um domingo, para saudar e homenagear um orixá publicamente, vestindo branco, portando suas guias, realizando suas orações sem medo de julgamentos. Essa doce Mãe, que zela por todos os Orí, é a força que dá sentido à minha vida, é a água que me acalma e a imensidão que me protege”, finaliza Joana. 

Edição: Elen Carvalho