A primeira entrevista do ano do Brasil de Fato Bahia é com Evanildo Costa, da Direção Nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) na Bahia, sobre a realidade das lutas pela terra no Brasil e na Bahia. Confira a entrevista:
Brasil de Fato Bahia: Como têm se dado as lutas no campo atualmente?
Evanildo Costa: A conjuntura que a gente está vivendo é uma tragédia. Temos 426 áreas vistoriadas em diversas fases no Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) já em processo de emissão de posse, outras em avaliação, todas foram paralisadas; 187 áreas ajuizadas que eles pedem para devolver a área para o fazendeiro, ou seja, não será emitida a posse; e 74 assentamentos já com emissão de posse, que o governo quer fazer seleção pública junto aos prefeitos, para que eles encaixem seus cabos eleitorais, não as pessoas que estão lutando pela terra. Por outro lado o governo pretende privatizar os assentamentos, com o objetivo de individualizar os assentados, porque fragmenta a luta. Com essa medida provisória que eles estão lançando, a partir da qual o fazendeiro pode se autodeclarar dono de qualquer tipo de território, isso é uma tragédia também, porque imagina um fazendeiro se apropriar de uma área do pequeno produtor, quem é que vai provar que é o dono?
E qual é o cenário na Bahia?
Não é diferente – tudo paralisado, os fazendeiros com essa orientação do governo federal, o incentivo ao armamento no campo, estão vindo pra cima, temos muitos assentamentos que vêm sofrendo ameaças de pistoleiros, de milícias, tentando amedrontar e expulsar as famílias a troco de tiros. A gente tem feito muita resistência, mas em alguns momentos, como no caso de Juazeiro, que é uma área consolidada – desde 2007 que a gente tem um acordo [com o governo anterior] para que disponibilizem assentamentos para 1000 famílias, até hoje não foi cumprido, e este governo, com toda sua truculência, utilizou de policiais federais para destruir 700 hectares de roça produtiva, jogando as famílias na beira da pista. Em outros acampamentos a gente tem sofrido pressão para reintegrar áreas em que proprietários tinham feito acordo com o Incra e, na medida em que o governo paralisou todos os processos, os fazendeiros vêm pra cima para reintegrar.
Como se organizar para resistir? E qual a importância da reestruturação fundiária?
Nós temos tentado debater com o governo do estado, que não pode ser conivente com a situação de conflito, com a falta de compromisso do governo federal, porque tanto vai inviabilizar o processo de reforma agrária como retornar as famílias que estão produzindo para a cidade, aumentando a miséria urbana. São muitas áreas que o governo da Bahia fez parte do acordo com o governo federal, já consolidadas, em que as famílias estão produzindo há mais de dez anos. Além de discutir a questão das reintegrações de posse, não deixar os assentados tratarem direto com a polícia, mas que o governo possa criar uma equipe de interlocução e que possa achar saída pra resolver não só a situação do fazendeiro, mas também das famílias que se encontram acampadas. A gente sabe que o governo federal não está brincando quando fala de armar os fazendeiros, então precisa ter muita cautela. Estamos num momento de resistência para não perder os territórios já conquistados e fazer lutas estratégicas para que não coloque em risco a vida de nossa militância diante de um governo que quer tratar a reforma agrária criminalizando e reprimindo a classe trabalhadora. Pretendemos avançar no debate sobre a importância da reforma agrária popular, que é de onde sai o alimento saudável, de qualidade e quantidade para o povo brasileiro – dos assentamentos e da agricultura familiar. Temos feito muitas feiras livres, de agroecologia e atos culturais. Essa disputa de ideias a gente tem que fazer para que a sociedade entenda a importância de lutar pelos seus direitos, e ao mesmo tempo defender uma distribuição de terra nesse país, que a exclusão social, a miséria só vão acabar quando houver uma grande distribuição para que as pessoas possam ir para o campo criar sua família, ter uma estabilidade de vida e desinchar a cidade.
Edição: Elen Carvalho