No dia 13 de novembro, a nossa brigada do Congresso do povo esteve visitando e dialogando com a comunidade de Ilha de Maré em Salvador (BA). Destaca-se que a grande maioria das pessoas com as quais estabelecemos diálogo foram as mulheres, que deram testemunhos da luta, do abandono e da valentia dos homens e mulheres desta comunidade que resiste e é responsável pelo abastecimento de pescado e mariscos nas mesas do povo e nos restaurantes das cidades em toda a região metropolitana de Salvador.
As pescadoras denunciaram os impactos econômicos e ambientais do vazamento do óleo que contaminou os mares e praias, mas também os problemas na saúde da comunidade que vêm sendo provocado pelo extrativismo mineral nos arredores de toda Ilha, com o descaso e conivência dos governantes locais, estaduais e federais.
A comunidade denuncia que, ao mesmo tempo em que os povos do território geram extraordinária riqueza com as atividades pesqueiras, fornecendo os alimentos do mar e também pelo petróleo extraído na região, essa comunidade de afrodescendentes -pescadores, marisqueiras e quilombolas - encontra-se muito empobrecida e negligenciada pelas políticas publicas de educação e saúde. O que revela que, além da superexploração do trabalho e da produção, a população da Iha é vitima do racismo social e ambiental.
É inadmissível que uma comunidade que tanto contribui ao desenvolvimento de Salvador e da Bahia esteja a seis meses sem atendimento médico, e o Governo Municipal e o Ministério Público permaneçam omissos sobre essa situação. Com ajuda de companheiros do setor de saúde do MST, que integram a brigada do Congresso do Povo, foi constatado que as principais vitimas são mulheres e crianças. Os problemas de saúde se gravam pela falta de médicos que atendam a comunidade, mas também pelas dificuldades de acesso a exames, o que leva, segundo relato das moradoras, ao diagnóstico tardio de câncer nas mulheres da Ilha, uma das principais causa da mortalidade feminina. Outro problema diagnosticado é relativo a lesões ósseas e musculares em homens e mulheres provocados pela exaustão de trabalho e excesso de pesos a que estão submetidos nas atividades pesqueiras.
A educação e o acesso a escola é outro grave problema. Os adolescentes e jovens estão sendo excluídos do direito à educação. Não existe escola de Ensino Médio em toda ilha, e o Ensino Fundamental completo é oferecido em apenas uma escola. Com isso, os jovens e adolescentes têm que enfrentar, de barco, as distancias e as intempéries e riscos no mar, além dos preconceitos a que estão sendo submetidos nas escolas urbanas de Salvador, como foi relatado por uma jovem moradora da ilha. "Eles olham para a gente e diz você cheira a peixe", afirmou.
Os jovens só podem estudar durante o dia, já que o último horário de embarcações encerra-se ao fim da tarde. Esse é um, entre outros fatores, que levam a exclusão dos jovens ao acesso e permanência na escola. A maioria deles são pescadores e pescadoras que trabalham durante o dia e em certos períodos na pesca. A proposta da escola não dialoga nem com o contexto, nem com as necessidades, cultura e realidade da população local.
Ao final da visita e atividades que realizamos, nós do Congresso do povo e o Movimento de Pescadores e Pescadoras artesanais MPP afirmamos o compromisso de seguirmos, como povos do campo e cidade, estabelecendo ações mútuas de solidariedade e de resistência em nossos territórios.
*Dirigente MST e membro do Congresso do Povo.
Edição: Elen Carvalho