Na memória afetiva do povo nordestino, o mês de junho é um dos mais importantes do ano. O motivo: as festas juninas. Primeiro porque é celebrado o tempo colheita e a partilha. Segundo porque vem logo na memória o som da sanfona e do triângulo, dos traques e bombas, o cheirinho do bolo de milho e aipim, o sabor dos licores e as coreografias das quadrilhas. Dá até pra lembrar do calor e a cor vibrante das labaredas das fogueiras. Sem esquecer do mais importante, as famílias se reunindo para compartilhar o momento. Santo Antônio, São João e São Pedro são festejados neste mês.
O professor de biologia Felipe Sena avalia que o São João é um dos momentos mais esperados do ano pelo povo sertanejo, porque representa o momento da colheita do milho e o encontro das famílias. “Não só ao redor das fogueiras, mas nas apresentações no São Gonçalo, no Samba de Véio, no Reisado que tem nas comunidades, acaba que todo esse momento ajuda a evocar a tradição cultural e folclórica que existe nas comunidades, como também é um momento de partilha, de encontros, de alegria, de festas, do forró, que é algo muito marcante em nossa cultura sertaneja”.
Felipe diz ainda que a tradição se mantêm nas comunidades como uma forma de resistência. “A gente percebe que dentro das cidades, aquela tradição de colocar uma fogueira na porta, de assar o milho e juntar a família está se perdendo, enfraquecendo e está dando lugar a grandes festas, grandes atrações culturais de forró, mas que tem apagado muito da história local, da identidade dos povos. E aí hoje é um desafio a gente valorizar os artistas locais, que precisam ter visibilidade, que estão todo ano trabalhando ao redor do são joão também”, pontua.
Zé de Jesus, agricultor da cidade de Caém, no centro norte da Bahia, fala sobre a importância das tradições juninas serem mantidas. Em sua região ainda se mantêm a quadrilha, o pau de sebo, o casamento matuto e o forró. “Para mim a importância dessas tradições é para se manter vivos os nossos antepassados, aqueles que viveram a vida fazendo isso para alegrar. São momentos de lazer, de partilha, onde as famílias se juntam para partilhar, para conversar, também trazer a tona os problemas da comunidade”.
Zé de Jesus ressalta que o sentimento que tem é o da diversidade cultural viva, "apesar dessas tradições virem sendo questionadas. Estão tirando essas tradições das comunidades, dos camponeses que têm toda essa identidade e estão levando para o poder público realizar. De fato não está saindo aquilo que a festa junina representa, mas, mesmo assim, as comunidades ainda vêm resistindo para manter isso vivo e sempre trazendo felicidade para as pessoas”, conclui.
A resistência pela manutenção das tradições acontece por todo o estado da Bahia e é um grande desafio. “O São João vem sofrendo perdas pela mudança de interesse, principalmente por conta da cultura do "forró de plástico", que distancia a população urbana das tradições dos antepassados”, finaliza Felipe Sena.
Na região do Alto Sertão de Guanambi e Caetité, várias das tradições são mantidas. Em Guanambi, a festa começa pela preparação da comemoração da festa do Padroeiro da cidade, Santo Antônio. Em Caetité, o São João tem um outro formato nos bairros. “Geralmente as associações de bairros assumem a festa junina. Todo final de semana tem em um bairro, a partir do primeiro até o último fim de semana de junho. Os bairros da Barriguda, Alto do Cristo, do Alto Buenos Aires, da Feira Velha contratam bandas locais de forró, tem a quadrilha, barraquinhas. É uma festa mais localizada, mas geralmente as pessoas do centro vão para os bairros. Acaba sendo um momento de intercâmbio”, afirma Miléia Almeida, professora de História.
A professora conta que a tradição das fogueiras se perdeu um pouco, por conta do asfaltamento, do trânsito e da renovação das gerações. Conta ainda que as pessoas costumam ir para zona rural e sítios para passar com a família.
Edição: Elen Carvalho